quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Piel

Piel
30/10/2015
00:04
Se le quemaba el cuerpo
Sobre sábanas blancas
El rojo la dominaba
Envuelta en color
Era toda fuego
Manos piernas senos culo
Entrepiernas
Lento, lento, lento
Dedos, movimiento
Dulce, fuerte, exquisito
Tranqui...
Se volvió sabana
Almohada y sueño
Se pintó de azul
Aline Alves


domingo, 25 de outubro de 2015

Porque já não

Porque já não
18/10/2015
23:32
Porque com você meu riso é muito mais doce, não devo sorrir docemente
Porque com você minha voz é mais melódica, preciso cantar melodias menos harmoniosas
Porque com você meu corpo se sente em casa, devo ensinar-lhe a ser forasteiro
Porque com você minha boca se encaixa, devo moldar novos formatos
Porque teu cheiro me embriaga, devo manter longas distâncias
Porque tua pele me arrepia, devo vestir  sempre paletó e luvas
Porque teu olhar me faz querer, devo desviar-me de cada zoom
Porque és tudo o que quero
Mas não estou em ti
Devo evitar ficar parada
De pé, atrapalhando o tráfego
Embreagem, primeira marcha.
Aline Alves

Silêncio

Silêncio
13/10/2015
00:37
Longe, perto, ao toque
Incomunicáveis
Um grito clamando calar-se
Pode-se sentir o cheiro
Indiferente
Sequência de palavras
Discurso ensaiado
Uma, duas, três
Nãaaaaaaao!
Já não cabe um sim
Perdeu-se em sussurros e gozos
Já não há pensamentos
A cabeça lhe dá voltas
Não está
Não há acorde possível
Romperam-se as cordas
Já não toca
Num canto, atrás da porta
A madeira de lei
Já não rescende
Não há canção
Não há paixão
O azul desfez-se em silêncio.
Aline Alves

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Saidade


21/09/2015
15:00
Ah saudade que me rodeia
Que me afronta, me desnorteia
Que vem, corrói
Apronta, desmonta
Me desconstrói
E esse xodó nem existia
Não me fluía nem me sabia
Daí veio, ardeu-me em chamas
Interveio
E agora ele nem existe
Mas continua, mantém-me, insiste
E a saudade em meu seio
Vai-me partindo ao meio
Uma quer ficar, a outra desiste.
Aline Alves

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

De amor não se morre


02/09/2015
11:14
"Quem pagará o enterro e as flores
 se eu morrer de amores?"
De amor não se morre, se vive
Olha tudo colorido
Corre, dá salto
Se machuca, solta gritos
Faz curativos num cantinho
Ah! Me deixa que os meus olhos tão cansados
Menos luz
Menos cor
O amor...me dá medo
Sim, saio correndo
Deixa o segredo pra lá
Guarda as flores
O dinheiro, o caixão
De amores, quero morrer não.
Aline Alves

Sem razão


31/08/2015
13:49
Daí você finge que não sente
Sente?
Fim de tarde, pôr-do-sol
E a gente?
Pula, brinca, bate palma
Ensaia um texto
Um sorriso, uma canção
Pede perdão, faz pecado
Volta à alcova
                          ... Vazia
Espalha os livros
Dorme sobre poemas
Escondidos, esquecidos
No azul no fundo da gaveta
Apagam-se as luzes
Ensaiam-se novos textos
Trim-trim, 6:01.
Aline Alves

Desejo


24/08/2015
13:39
Do nada
Uma vontade
Tua pele, minha pele
Teu cheiro, meu cheiro
Teu gosto
De língua, de homem, de sexo
Tua barba, minhas garras
Enlaçados, encaixados
Tuas mãos, meus cabelos
Tua boca, minha nuca
Sobrepostos
Sobressaltos
Leves
Mais leves
Escassos

Canção de violão


16/08/2015
21:34
Tornei-me seu violão
Em seu corpo aparentemente incompleto
Encaixei-me entre seus braços
Em seu colo
Já não faltava-lhe nada
Era eu seu instrumento
A madeira de meu corpo aconchegou-se
Em sua pele rescendia à madeira de lei
Seus dedos deslizaram em minhas cordas
Produziram notas de um bolero
E el reloj já não marcava as horas
Embora eu enlouquecesse ao refrão do bolero
Fiz-me gaita, sax, violoncelo
Era de sua boca, suas mãos...
Sob medida para a sua canção
Minhas notas foram tocadas uma a uma
Viraram samba, rock, pop, samba-canção, bossa-nova, s  e  r  e  n  a  t  a

Canção para dormir


24/08/2015
09:47
Quando teu violão me toca
Quero ser sonata
Partitura, serenata
Quedar-me ali
Sentir a brisa leve que escapa
De cada nota

Há noites de samba
Repique,atabaque
Há noites para ser só de violão
Deixar-se estar
Fechar os olhos
Abrir a alma

Nessas noites adormeço
Sem teus braços
Em teu som

terça-feira, 21 de julho de 2015

A un tal Jack Sparrow

Un Jack Sparrow que no es el capitán de nadie, sino de si mismo. No pertenece, es simplemente, y en serlo, pertenece intensamente, por un rato nomás. Te comanda con la sonrisa, con su toque, con sus labios. Es de nadie y es tuyo con todo su cuerpo. Te navega como si fueras su ruta, con aguas cálidas, de tranquilas a revueltas. Se hace inolvidable, pero deja claro que no podrá ser más que un recuerdo lejano. Y lo aceptas tú porque sabes que tener a Jack Sparrow es dejarse ser un navio que flota en aventura y sensación, donde no faltan risas, sentidos... Y te dejas abandonar con un beso en la frente, vuelves la mirada hacia atrás mientras Jack Sparrow vuelve con su raro caminar a su escondrijo de sueños, donde hay canciones, mates y una gata que lo ama.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Um brinde

Um brinde a todos aqueles amores que poderiam ser, não àqueles que geraram sofrimentos tantos que você cansou de tentar e desistiu de fazer dar certo, mas àqueles que simplesmente não puderam ficar, que te encontraram numa viagem de metrô, numa conversa de supermercado, num bloco de carnaval. Serão para sempre atraentes em nossas memórias.
Ao moço do bus 99 a caminho do bairro Floresta em Buenos Aires, um brinde, na minha memória, você continua lindamente desconsertado buscando músicas no celular e fingindo não ver meu olhar incisivo.
A Martín, do dia de San Patricio, um brinde, nunca soube seu sobrenome, não te pude encontrar no facebook.
Ao russo com quem dormi abraçada toda uma noite mas com quem nunca transei, um brinde, tenho certeza que teria sido ótimo, dormir já foi.
Ao cara do sobrenome alemão que me beijou pra me aquecer de um frio de outono, um brinde, posso sentir o calor daquele beijo até hoje. Bem mais fácil te beijar que pronunciar teu sobrenome.
Ao uruguaio que gritou " qué morocha, me caso!" em alguma rua da Colonia Sacramento, um brinde, mas não penso em casar...
Ao lindo venezuelano de uma disco em Puerto Madero, um brinde, e me desculpe por já estar erroneamente apaixonada antes de te encontrar.
Um brinde a todos os olhares que se cruzaram, que faiscaram, que prometeram. Um brinde à cantada sutil que alguém de muito bom gosto soube dar, ao papo bom que foi compartilhado, ao sorriso despertado, às faces rubras, ao cheiro envolvente, ao roçar de um toque que arrepia. Aos pequenos amores que alimentam o ego e nos fazem momentaneamente felizes. Que eles nos façam rir todos os dias, que eles nos façam saudosos a cada futuro.

Aline Alves




sexta-feira, 13 de março de 2015

A arte do desencontro - final

Domingo, 04 de janeiro de 2015, Lisboa, Portugal.

Enfim, era chegado o momento da partida. Deixar Portugal, um ao outro, sem saber como se rotularem. Que eram agora? Amigos? Inimigos? Ex-amantes? Não sabiam. Contudo, já não eram os mesmos. Já não eram a imagem outrora a milhares de quilômetros, já não eram os que se encontraram no aeroporto de Lisboa em um abraço terno, já não eram os que se entregaram com fervor em uma noite em Florença. Perderam-se demais ao longo desse encontro...
Era um dia lindo de sol na capital portuguesa. Havia ainda algumas horas a serem aproveitadas antes do adeus final. Comidinha, filminho, pipoca e uma boa dose de autocontrole. Como não brigar quando se queriam matar? Ela, por ele não ter sido nada do que ela imaginara e por tê-la cativado tanto sem querer ser responsável por isso; ele não lera O pequeno príncipe ainda. Ele, por ela também não ter sido nada do que ele sonhara. Ela era o seu sonho ao contrário, um sonho que se desfizera num beijo.
A viagem até o aeroporto era relativamente curta, não havia tempo para reconsiderações sobre todo o trajeto que se iniciara dia 17 de dezembro de 2014 e terminava quase vinte dias depois no mesmo ponto. Era um recomeço?

Em frente à área de embarque, os dois abraçaram-se para nunca mais. Um abraço que envolvia tudo o que não se podiam dizer, tudo o que não saberiam dizer. Ela, incompreensivelmente agarrava-se a ele, queria ficar ali para sempre, e as lágrimas saltaram-lhe sem freio, sem vergonha, sem pensar. Ele a estreitava em seus braços numa entrega, até então, negada. Em meio às lágrimas dela, ele a beijou, e ela quis que aquele beijo jamais acabasse. Ele lhe enxugou as lágrimas, consolava-a com os olhos e as mãos cheios de um carinho e de uma compreensão que ela tanto buscara durante aquela viagem. Enfim, encontrara, era, porém, demasiado tarde. No tardar da hora, desvencilharam-se obrigatoriamente. Ela não olhou para trás, ele também não, seguiram seus caminhos. Quem os visse ali, numa despedida tão doída e tão doce, julgaria, sem dúvida, tratar-se de um casal apaixonado. Quem não os terá invejado naquele momento tão inexplicado? Mas como o coração do outro é terra de ninguém, ela voltava pesada de ressentimentos e com o coração em frangalhos. Ele sentia-se enfim livre do peso de um sonho que não foi. De tudo, restou aos dois a certeza de nunca haverem-se encontrado.


quinta-feira, 12 de março de 2015

A arte do desencontro

Sábado, 03 de janeiro de 2015, Lisboa, Portugal.

Hora de despedir-se de Roma, Não puderam acordar cedo para um último passeio. Saíram, como sempre, já no limite do horário para o voo.
A viagem chegara a sua reta final. Haviam sido quase vinte dias de Europa. O velho mundo, o sonho de nove em cada dez não europeus. Mas para ela, era simplesmente como se não estivesse ali. Perguntava-se o que havia feito do sonho mais antigo, da euforia do primeiro momento, da visão e da sensação de tudo aquilo. Havia desperdiçado o seu sonho maior. Não amou um italiano nem um espanhol, nem mesmo comera uma pizza de verdade em Roma. Uma alma inundada de tristeza não reconhece a alegria ao lado, não a desfruta nem se deixa contagiar por ela. Sentia que tudo havia sido em vão. Havia cometido o pior dos erros, encolhera a própria alma.
Ao lado, ele escutava música e fingia dormir, alheio a toda a turbulência na mente dela. No último voo juntos, nada mudou. Ele seguia no seu mundinho, ela afundava em suas conclusões terríveis. Escrevia na tentativa de livrar-se de toda aquela angústia que lhe sufocava o peito. Escreveu durante todo o voo. Disse ali tudo que talvez jamais pudesse dizer, enquanto ele mantinha-se distante o suficiente para que nada daquilo pudesse chegar a tocá-lo.
No aeroporto de Lisboa, ela sentiu a dor do contraste. Naquele exato lugar, há pouco mais de duas semanas, tinha em si todos os sonhos do mundo. Vivera a alegria do encontro e abrira o seu coração para dar e receber o amor com que sempre sonhara, o amor que ele conquistara, o amor que ele cativara pacientemente e que ela decidira permitir-se sentir.  Naquele momento, tudo era possível.  Agora, via destruída toda a ilusão que ele despertara nela. Não encontrava melhor palavra para descrever-se que infeliz. O céu lisboeta pintava-se de laranja num crepúsculo envolvente e romântico. Ela olhava, sentia e não podia sorrir. Ao seu lado, ele tentava objetivamente reencontrar o caminho ao hotel. Ônibus, metrô. Ela deixava ele decidir sempre, não se importava, não tinha opinião, não tinha vontades.
No hotel, um banho e o choque de que realmente era o fim a fez desejar fazer algo bom, divertir-se um pouco. Vestiu-se para ele, cuidadosamente. Pôs a melhor lingerie e o melhor sorriso. Jantaram num bom e tradicional restaurante português. Embriagaram-se em meio à Avenida da Liberdade e voltaram mais leves ao hotel. Ensaiaram uma dança que não encaixou. Ela bailava com a graça e sensualidade só permitidas a uma morena brasileira depois da meia-noite. Ele era o que era, um físico supertalentoso e meio antissocial que dançando pouco se distinguia de um robô não articulado. Ela quis rir, mas sabia que o constrangeria e, ao contrario dele, sempre cuidava para não magoá-lo.

Preparou-se para a última noite. Queria esquecer tudo e pertencer a ele uma vez mais. Vestiu seu melhor olhar, seu melhor sorriso e seu decote mais profundo. Ele não resistiu, depois de três dias longe do corpo dela, ele lançava-se a ele com um desejo que era quase fúria e ela sentia o poder da sua feminilidade a envolvê-lo. Aquilo produzia nela uma sensação indizível. Mas logo ele já não queria apenas penetrá-la e compartilhar prazer, queria usá-la a seu bel prazer, do seu jeito, e ela não viu prazer nisso. Disse não e quase vacilou, mas quase vinte dias eram suficientes para saber que ele não valia o sacrifício. Quando viera, estava disposta a dar a ele cada rincón do seu corpo, cada centímetro de sua alma. Ele, porém, negara-se a provar da sua alma, do seu amor. Ela, pensando em tudo isso, resolvera enfim pensar em si e negar-se a  ele. Impedido de sua vontade, ele agiu como o menino mimado que sempre fora e a rechaçou. Ela, magoada, afastou-se, dormiu sozinha outra vez, mas dessa vez, ela o odiava demais para chorar.


domingo, 8 de março de 2015

A arte do desencontro

Sexta-feira, 02 de janeiro de 2015, Roma, Itália.


Terceiro dia em Roma e ainda não haviam visto muito. O cansaço os consumia. O turismo estava mais para obrigação que para diversão. Estavam em Roma, em pouco tempo não estariam mais. Havia muito o que ver e não dava para ficar na cama a curtir toda a preguiça que vinha com o inverno. Caminare a ver o Vaticano!
O clima entre eles não era dos mais amistosos. Ela anulava-se ao máximo para não incomodá-lo, ele incomodava-se sempre. Com a forma como ela o olhava, como caminhava, como mantinha-se desatenta. Toda ela era um incômodo, ela sentia, e desejava poder ser invisível.

Tranvia, metrô, Coliseu. Fotos, fotos, fotos. Dele, porque ela já não se importava. Uma dor começou a importuná-lo, tinha a cabeça em colapso. Antes de qualquer coisa, ele a tratou mal. Ela aceitou o maltrato diminuindo-se um pouco mais, já quase não existia. Preocupava-se com ele. ¿Qué le pasaba que le dolía tanto la cabeza? Cuidou dele. Tratou de achar o camino, apesar de nunca prestar atenção e ser péssima com mapas. Amava-o apesar de tudo e não queria que nada de ruim lhe acontecesse.
Foi um dia de distâncias. Ela acreditava que as religiões mais afastavam que reuniam as pessoas. No Vaticano não foi diferente. Em meio ao mundo sagrado católico, eles caminhavam no meio de uma multidão que nada mais podia compartilhar. Todos de olhos e ouvidos atentos.  Foi um dia de paz em meio a tantos passos e burburinhos, além da voz da guia a gritar-lhes nos ouvidos. Quase não se falaram, não puderam brigar. Mas, uma hora a visita acabou e eles foram expulsos do paraíso dos mundinhos inviduais e recomeçaram a incansável desarmonia. Vencida, ela resignou-se uma vez mais em busca de alguma paz. Sempre era melhor quando escolhia não falar, não brigar, não expor-se. Por dentro ela ia definhando, por fora, a expressão entregava-lhe os pensamentos. Tinha o sorriso cada vez mais triste e dos olhos sempre reluzentes, encantadores, expressivos não escapava nada mais que um pranto oculto.

No último dia em Roma, não houve amor, não houve carinho, não houve perdão. Na cidade mais sensual da Itália, não houve sexo. Não houve nada. No meio da noite, ele quis tocá-la, mas algo o fez recuar, ela não insistiu. Adormeceu na solidão, entre mágoas e desejos.

A arte do desencontro

Quinta-feira, 01 de janeiro de 2015, Roma, Itália.

O primeiro dia do ano iniciara-se turbulento, mas ao menos ela conseguira dormir. Ele iniciou a conversa. Funcionava como uma espécie de esquizofrênico, num eterno câmbio de personalidade que ia do cruel ao extremamente terno. Era capaz de dizer a ela as coisas mais duras e cinco minutos depois esfregar-se nela como um gato dengoso a buscar carinho, falando manso e movendo-se com doçura desmedida. A cabeça dela não entendia aquilo. Era louco? Como em três anos de convivência ela não percebera aquela personalidade no mínimo perturbada?
Desceu em busca do café da manhã, quase hora do almoço e ela descia em busca do café. Em dia de ano novo, passando férias em Roma com aquele que ela imaginava ser o amor da sua vida, era quase cômico ela a lutar com seu inglês de merda para trazer aos dois o café que ele, obviamente, teve de criticar. Mas era isso ou morrer de fome. Era não moveria o magro traseiro para usar seu inglês fluente e fazer um favor aos dois.
O primeiro dia de visita histórica a Roma foi um delírio para ele, uma anestesia para ela. Ainda sentia-se mal pelo que ocorrera na madrugada e o psicológico parecia afetar-lhe o físico. Sentia-se mal, como se em cada célula sua houvessem injetado lactose. Tinha no rosto um riso curto e no coração uma lágrima longa. 



sábado, 7 de março de 2015

A arte do desencontro

Quarta-feira, 31 de dezembro de 2014, Roma, Itália.


Era um dia ensolarado na capital italiana, mas andava longe de ser quente. Como em toda grande metrópole, e em pleno 31 de dezembro, a cidade fervilhava. Parecia que todos haviam tido a mesma ideia deles, passar o réveillon em Roma. Só para variar um pouco, eles estavam exaustos. Após uma noite regada à cerveja e sexo, com direito a neve na saída, eles não haviam descansado muito, além disso, estavam famintos. Muitas opções, escolhas, escolhas, escolhas. Foram parar num restaurante indiano. Alguém explica histórica social e politicamente por que há tanto indiano morando em Roma?
Ela sequer conseguia decidir o que pedir. Com o passar dos dias e o tratamento rude que muitas vezes ele dispensava a ela, exigindo sempre respostas racionais rápidas, ela atrapalhava-se com o mínimo. Acabou com um frango excessivamente apimentado e uma porção de batatas fritas, que claro, ele criticou. ¿Estás harto con las papas fritas, eh? Não importava o que ela dissesse, fizesse, como se portasse, nunca era o jeito certo ou a escolha certa para ele. Estava farta. A única coisa que naquele momento lhe provocou alguma graça foi o fato de ele achar estranho haver espinha no peixe que ele comia. Onde esse garoto viveu a sua vida inteira? Lá, peixes são invertebrados? O país pseudodesenvolvido queridinho da América do Sul e logo, a vida na Europa. Nunca o deixaram a par da realidade. Ele parecia saber tudo, perdia-se, porém, nas coisas simples.
O hotel não ficava tão distante do centro histórico, mas era bem esquisito.  O bairro parecia saído de um filme da máfia e dentro do hotel não parecia muito melhor. Um cheiro estranho desprendia-se dali e do quarto ouvia-se tudo ao redor, incluindo as conversas dos quartos vizinhos. “Lovely Roma”, really? Bem, o que esperar de um nome tão clichê? Talvez que fosse ao menos, menos frio.
Réveillon em Roma! Ela tentou alegrar-se com a realidade e animá-lo de alguma forma. Era noite de ano novo, uma noite para muitos drinks, muitos desejos e para recomeços, embora o único transporte que chegasse ali fosse o tranvia e em noite de réveillon só funcionasse até ás 9h30min da noite.
A intenção era comemorar o ano novo no Coliseu, mas depois da aventura de não conseguir transporte até a estação Termini, caminhar a pé por 20 minutos, parar numa cafeteria onde uma senhora gorda e com dentes mal cuidados gritava enquanto tentava consertar a luz que caía a cada dois minutos, comer uma pizza requentada em uma lanchonete indiana, – ainda há alguma pizzaria italiana em Roma?- e perderem-se um do outro no metrô,  o máximo que eles conseguiram foi chegar até o Circus Massimus.  Ele ainda estava bravo pelo fato de ela ter se perdido dele no metrô, ela ainda sentia-se mal por ter feito uma nova besteira. Mas ele despiu-se do rancor e a beijou à meia-noite. Um beijo insosso, desses que os atores globais se dão em novelas das seis, pouca língua, pouca saliva, pouca verdade. Mas ela sentia-se feliz, nunca fora beijada em noite de ano novo, era um pedacinho de sonho a realizar-se.
A noite corria bem, ele gostava da música, compartilhava seus risos com ela, tomava-a da mão. Ela sentia a felicidade no corpo, nas maçãs do rosto, no seu próprio riso. Mas o álcool a tomou rapidamente e ela ficou frágil e sonolenta. Ele começou a achar aquilo um saco. Que droga de companheira de farra era aquela? Quando cansou-se de carregá-la por todos os lados, resolveu voltar para casa que ficava a uma hora de caminhada, com sorte, e eles nem sabiam por onde começar. No meio do caminho, ela recebeu um golpe do destino. Em uma cafeteria qualquer de Roma, uma loira de olhos claros e ternos roubou dela o que de atenção ela ainda supunha receber dele. Ao sair, ele falou tanto da moça que ela se sentiu enterrar entre as ruínas romanas. Não podia competir com aquela beleza. Sentia-se esmagada. Ela estava ali, era toda dele e ele não a via.
Quando na cama os olhos fecharam-se em busca do sono que não vinha, ele veio tocá-la. Ela o rejeitou, ele a feriu, e já não havendo lágrimas, ela adormeceu entre mágoas que tornavam o novo ano nada mais que um borrão inicial.


quinta-feira, 5 de março de 2015

A arte do encontro

Terça-feira, 30 de dezembro de 2014, Florença, Itália.

Último dia em Florença, a cidade do renascimento onde ela continuava a parecer morrer. Era como se o tempo todo e a qualquer momento fossem lhe saltar as lágrimas. Ele só pensava em descansar bastante, percorrer o máximo o que lhe interessasse e satisfazer seus instintos primitivos. Abastecia-se de comida, cultura e sexo sem carinho e sem compromisso. O que mais um homem poderia querer?
Ela fazia de tudo para agradá-lo, mesmo quando isso a deixava cansada e infeliz. Ela que esperava ser acordada com beijos e um cappuccino, via-se a buscar o café dele na padaria mais próxima. De agradecimento? Uma reclamação por ela ter esquecido o açúcar. Cada vez que fazia algo errado, ela sentia-se mais idiota. Por mais que se empenhasse, ela nunca fazia algo completamente certo, simplesmente não conseguia concentrar-se em absolutamente nada mais que na própria desilusão e na rejeição sofrida pelo amor que ele tanto cultivara e para o qual já não dava a mínima, antes, lhe era incômodo.
Era o último dia ali e ela juntava forças, não sabia de onde, para levar algo bom de tudo aquilo. Na terra das ideias que salvaram o mundo da ignorância e o encheram de beleza, ela esforçava-se para encontrar em si algo de belo e para salvar sua alma da própria tristeza.
Estiveram todo o dia a passear por igrejas, museus, ruas lindas e estreitas da formosa Florença. Alguns risos naturais escapavam dela às vezes. Havia sido um bom dia, não podiam negar. Ele até a presenteara com um livro, um livro de Neruda, “Confieso que he vivido”, era o que ela sonhara dizer ao fim daquela viagem que prometera ser a viagem da sua vida.
De volta ao hotel, a promessa de voltar a sair e despedir-se da cidade fazia-se difícil. A cama aconchegante os abraçava com total entrega, mas desvencilharam-se dela e enfim saíram. Nova briga. Ficaram estagnados. Ele negava-se a oferecer-lhe o braço numa simples atitude de cavalheirismo e cuidado. Ela quedava-se a perguntar em que momento o “todavia me puedes tomar del brazo”, dito em Madri, havia-se transformado em “no me jodas”. Só lembrava que havia sido rápido demais e ela não pudera acompanhar. Por fim, o impasse se desfez, apesar dos pesares, ela não queria destruir aquela última noite e, como sempre, cedeu.
A cerveja deixava as coisas sempre mais tragáveis, mas ela se embriagava rápido demais e nunca o acompanhava. Ele bebia, bebia, e punha-se a falar das mulheres que amou, às quais, ela sabia, nunca se equipararia. Ela ficava a ouvir tudo, pacientemente, só para mirar-lhe os olhos, que diferentes dele, eram extremamente doces e tinham uma cor só conseguida quando um fio de mel é tocado por um raio de sol. Poderia passar horas apenas olhando aqueles olhos, incansavelmente.

Ao fim da noite, em meio à madrugada fria do inverno italiano e ao gelo dos seus pensamentos sombrios, ela foi tomada por um beijo, um beijo suave, longo, carinhoso. Fê-la lembrar-se do primeiro beijo, quando o céu abriu-se para ela. As lágrimas vieram brincar nos seus olhos, mas ela não as deixou cair, negou-se. Estava feliz, feliz! No hotel, seguiram-se outros beijos. Já não havia frio, seu corpo nu passeava pelas mãos dele, entregue, como se houvesse morado ali uma vida inteira, e carne e carne se cruzaram num prazer inefável, indizível. No chuveiro, novamente ela não acreditou quando ele a beijou e deixou-se estar. Entregou-se tanto que perdeu o medo, esqueceu-se da dor e da mágoa e quando tudo parecia perfeito e renascido, o dia amanheceu fazendo com que ele recuasse e desse a ela de bom dia uma dose de arrependimento.

A arte do desencontro

Segunda-feira, 29 de dezembro de 2014, Florença, Itália.


Chegaram a Florença em um dia lindo. Apesar do frio, o sol brilhava radiante. Ela, em contraste, sentia-se destruída. Acordara cedo, como sempre acontecia nos dias de viagem- e esses dias pareciam acercar-se cada vez mais rapidamente – não houvera tempo para grandes cuidados. Tinha o cabelo acabado pela água quente, o rosto queimado pelo frio e a autoestima derrubada pela maneira como ele a olhava. Sentia-se profundamente sozinha, triste e cansada. Olhou-se com temor no espelho do café e notou que ele refletia toda a sua tristeza.
O hotel ficava um pouco longe do centro, tiveram de caminhar por cerca de 30 minutos até finalmente encontrá-lo. Ele, claro, não podia fazê-lo sem o seu andar apressado e sem as reclamações habituais. Desde Barcelona, andava sempre como se estivesse atrasado para um encontro e reclamava de tudo que não lhe saía tal qual sua vontade, e até isso, não sabia bem porque, fazia-a sentir-se culpada.

Apesar de um pouco afastado, o hotel era uma graça e situava-se em um aconchegante bairro residencial. O quarto era, no entanto, frio, frio como o coração dele mostrava-se a ela a cada dia. Como acontecia de forma cada vez mais frequente, eles discutiram logo na chegada. O coração magoado dela procurava as respostas, ele não estava interessado em perguntas, e a feriu ainda mais. Ela chorou, chorou, chorou e ele veio depois adormecer em seus braços tão mutilados de cansaço. Não entendia por que, mas sempre terminava nos braços dela, entre suas pernas e seios.

A arte do desencontro

Domingo, 28 de dezembro de 2014, Veneza, Itália.


Segundo dia em Veneza, que era, na verdade, o primeiro. Demorara a amanhecer naquele quarto frio. Saíram já quase à hora do almoço. A cidade era esquisitamente linda durante o dia. Havia um colorido que emanava daquelas ruínas em meio àquelas águas de um verde não saudável.
Ela perguntava-se onde estava escondida aquela cidade na noite anterior. Até uma pista de patinação no gelo brotara do nada. Genial! Sentiu-se alegre por alguns minutos, mas vez em quando a melancolia sussurrava-lhe ao ouvido. Ela fingia não ouvir, mas nunca fora boa em dissimular.
Era uma cidade para os amantes, não tinha dúvidas. Quando escolheu ir lá, pensara nisso. Como não se apaixonar na cidade mais romântica da Europa? Ela tristemente descobriu que para ele isso era possível.
Ele achava tudo incrível. Era apaixonado por ruínas, cidades antigas, prédios antigos. Veneza era perfeita para ele. Antiga, em ruínas e com um concerto de Vivaldi em cada esquina. Para ela, era irrelevante, não entendia de música clássica. Para ele era o paraíso. Para variar, discutiram por isso. Mas o passeio estava agradável naquele dia que se fizera noite. Última noite em Veneza... Um pouco de álcool para acalmar os ânimos e recompor a alma.

Desde que chegara à Europa e ele demonstrara não querê-la, ela sempre achava que precisava de uma dose a mais. Só assim ela divertia-se, só assim ela libertava-se. Em meio à embriaguez, doía-lhe menos o fato de haver sempre uma europeia tão linda para ele quanto ela jamais seria.

A arte do desencontro

Sábado, 27 de dezembro de 2014, Veneza, Itália.

A viagem para a Itália não teve nada de sonho europeu, foi antes de tudo um pesadelo. Saíram de Paris atrasadíssimos e ela ainda pensou haver esquecido a câmera no hotel. Não havia. Andava tão aérea em meio àquela aura de desejos reprimidos e sonhos esmagados que esquecera que havia posto a câmera no bolso da jaqueta. Ela se odiou, ele a odiou. Ela se sentia tão mal que mesmo sendo muito cética, pedia em pensamento o tempo todo: por favor, que cheguemos a tempo.
Por fim, chegaram a tempo, a tempo demais. O voo atrasou cinco horas, cinco horas em que eles tiveram de ficar ali a odiar-se mutuamente. Durante anos, eles tiveram o que dizer por horas seguidas, quase que diariamente, e eles nem se conheciam... Agora eles estavam frente a frente há apenas dez dias e lhes escapava pouco mais que um olhar de reprovação e tristeza. Ela então trocou o olhar vazio por papel e caneta e transformou em poema toda a sua desilusão. Em meio a tanta espera, ela não encontrou o ombro da noite anterior. Era já outro dia.
Chegaram a Veneza à noite, uma noite gelada, com pouca luz e de comunicação reduzida. Ninguém falava a língua deles. Foram indo meio levados pelo vento e quase não encontraram o hotel. A cidade era um labirinto congelante em ruínas. Ela não encontrava melhor palavra para descrevê-la que ASSUSTADORA.  Era inverno na romântica Veneza e o único pensamento que ela conseguia ter era: os dedos dos meus pés estão congelando! Por fim, ele encontrou o caminho. Era muito bom nisso, talvez decodificasse o caminho em números.

No hotel de calefação inibida, eles dormiram abraçados, mas quando os lençóis se aqueceram, ela fugiu dele e dormiu apenas sob o calor do próprio cobertor.

terça-feira, 3 de março de 2015

A arte do desencontro

Sexta-feira, 26 de dezembro de 2014, Paris, França.


Último dia em Paris. Dia do tour cultural parisiense. Museu D’Orsay, Louvre, Versalhes - este, na verdade, nem em Paris fica. Chegar às nove ao primeiro museu, ficar duas horas, almoçar, ir a Versalhes, ficar entre três e quatro horas e ir ao Louvre. Era o plano. Ela acordou às nove e, como em todos os dias, começou a lutar para despertá-lo. Nunca cumpriam os planos, nunca cumpriam os horários e com muita sorte ainda não tinham perdido nenhum trem nem nenhum voo. Com muita luta, chegaram ao D’Orsay às dez e meia, entraram quase às onze e desperdiçaram muitos euros, não lhes foi possível ver quase nada. Não havia tempo, simplesmente. Era isso ou perder Versalhes, Louvre, então, tchau D’Orsay, foi bom o meio encontro.
Versalhes ficava um pouco distante do centro de Paris, eram muitos minutos de trem até lá. Os arredores eram muito tranquilos, pacatos. Quem diria que ali vivera o tão badalado rei Luís XIV. Era tudo mais melancólico, doce, calmo e impressionantemente frio. Puta que pariu, como era frio!
O palácio do rei sol era tão impressionante que ela que nunca estivera ali, mal conseguia entender-se de fato ali, sentia-se dentro de um livro de história. Ele, que já estivera, movia-se encantado como uma criança. Aliás, comportar-se como uma criança era algo inerente à personalidade dele, às vezes, chegava a assustá-la. Quando menos esperava, deparava-se com um garotinho em seus braços a pedir carinho em um tom de voz que não ia além dos oito anos. Amor, estranho amor...
Era novamente um dia bastante nublado, o sol parecia ter sido apenas uma cortesia natalina. Fora, nos imensos jardins do palácio, estava lindamente triste. Ela olhava, longe, longe... Quantos se haverão amado em meio àquela pintura tão real... Princesas, reis, súditos, gente normal. Mas ela não amaria ninguém ali, nem seria amada e ponto.
Quando chegaram ao jardim, o dia já estava se despedindo. O frio era cortante, tão cortante quanto as palavras dele que vez ou outra faziam questão de reafirmar a ela, não somos namorados, não exija de mim mais que as migalhas que às vezes te ofereço. Ao menos era assim que ela ouvia, acrescido de um não insista, você não é boa o suficiente para mim. Queria tão pouco, um abraço que a protegesse do frio, uma palavra de carinho e uma gentileza como pedir o lanche para ela já seriam suficientes. Mas para ele já era demais. Não entendia a necessidade dela e aborrecia-lhe a insistência. Ela cansou de tanto suportar, afastou-o e as lágrimas rolaram-lhe livremente pela face. Naquele momento, algo naquela cena mexeu com ele. Percebeu enfim que a machucara de verdade, pela primeira vez, ela sequer o queria por perto. Pela primeira vez, ela lhe dizia não. Ele se perguntou o que estava fazendo. Queria consertar aquilo, mas não sabia o que fazer, o que dizer. Afastou-se como ela pedira, acompanhou-a de longe e em silencio, a inventar meios de tornar aquilo menos doloroso. Na saída, ele a abraçou, ela chorou ainda mais. Que falta ela sentia daquele carinho, que triste que ele não pudesse ser sempre assim. A viagem de trem até Paris foi confortante. Eles dormiram no ombro um do outro. Há quanto tempo não o faziam? Nesses poucos momentos de ternura, emanava deles uma beleza, uma paz...
O passeio no Louvre era a última parada de Paris, despediam-se da cidade mais amada e comentada do mundo em grande estilo. A despedida foi tão demorada que à hora do jantar a impessoalidade voltou a dar-lhes um beijo.
Já na cama, quase adormecida, ela sentiu a mão dele percorrer-lhe as costas e estremeceu. Mas já não queria seguir com a síndrome do dia seguinte, cada vez que se entregava a ele sentia-se mais dependente daquele sentimento. Lutou para não entregar-se, mas ela era pequena, frágil, ele a teve facilmente presa em seus braços. Quando já o corpo dela deslizava sobre dele, ela indagou-lhe se não lhe importava machuca-la e ele se importou. Como à tarde no jardim, ele percebeu que a feria e renunciou ao próprio prazer. Não queria fazê-la sofrer, mas como era bom estar dentro dela... E na última noite noite em Paris, eles adormeceram sobre o próprio desejo.


domingo, 22 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Quinta-feira, 25 de dezembro de 2014, Paris, França.

O que há para ver na Paris dos seus sonhos quando é natal e todos os museus estão fechados? Tudo. Todas as lindas pontes, os cadeados, o Sena, Notredame, os tantos cenários dos filmes de sua vida e, para completar, um céu azul em pleno inverno.
Ela despertou antes dele, banhou-se, preparou-se, maquiou-se. No seu segundo dia em Paris, queria, ao menos, sentir-se bonita. Pareceu funcionar, até mesmo ele dedicou-lhe um elogio. !Qué linda! Não acreditou muito, mas gostou de ouvir.
A cidade estava escandalosamente uau! Sair do metrô naquela manhã de dezembro era como adentrar ao paraíso. O sol brilhava num azul que cheirava a algodão doce. Os carros e as pessoas moviam-se para todos os lados, nem parecia feriado. Notredame não era sombria como no filme da Disney e o Corcunda não estava lá para espalhar a sua tristeza e o seu sofrer. Era tudo linearmente perfeito. Ela permitiu ao sol brilhar nela e sorriu de verdade. Ele caminhava ao lado. Foto, foto, foto. Era uma espécie de fixação. Fotografava tudo, nem tanto ele, não era do tipo narcisista, tinha simplesmente a mania de fotografar cada monumento, placa, instrumentos e destes, cada um de seus detalhes, e pior, o fazia super mal. Que bom que não optara pela carreira de fotógrafo.
Caminharam pela cidade a buscar distração em um dia em que a cultura estava de férias. Foram em busca de Jesse e Celine. No caminho, lá estava, a mais famosa ponte do amor. Havia, em cada parte dela, amores aprisionados, amores que, como o da nossa heroína, sonharam com Paris. Contudo, aqueles se fixaram ali em algum momento. O que houve depois, se naufragaram, se se desvencilharam, não se sabe, porém ali, em algum momento e fixados naquela ponte, eles foram simplesmente amor. Ela olhou com pesar para todos aqueles amores encarcerados e sentiu-se mal por não ser prisioneira. Mais uma vez seu amorzinho clichê saíra das palavras para chocar-se e desfazer-se numa aterrissagem sem trem de pouso. Ele? Fotografava. E como nem todo amor é feito de correntes, continuaram a buscar o amor que sobrevivera à liberdade. Ali estava, ela não podia acreditar. Ao fim de uma rua estreita, em alguma curva de Paris, Sheakspeare and Company. Nos seus sonhos, ela visualizava Jesse e seu livro da maior história de amor que poderia caber before sunrise. Por um breve momento, ela lembrou que não era a Celine e que ele jamais seria o seu Jesse. A tristeza quis dar-lhe um tapa, mas rememorar o verdadeiro Before Sunset era muito melhor. Pisava o mesmo solo em que o seu casal favorito se havia reencontrado para continuar a noite nunca esquecida. Ele? A fotografava. Ele era, enfim, responsável por dar a ela alguma felicidade.
Depois do encontro com o amor improvável, saíram em busca do amor divertido, confuso e fabuloso de Amelie Polain. Bateram à sua porta, tomaram seu café, até mesmo perambularam pelas mesmas estações de trem e de metrô que ela, mas não puderam alugar um dos filmes sacanas do Nino, não o encontraram. Havia sido um lindo dia, mas como nem tudo são flores na terra de Napoleão, ele teve de derramar espinhos para que ela espetasse o pé no caminho de volta.

¿Fumas conmigo? Esta marca de cigarros me la indicó la rusa, ahí empecé a fumarlos. Odiava cigarros. O cheiro, o gosto. Por ele, talvez abrisse uma exceção, mas como partilhar com ele a lembrança de outra? Outra que fora para ele tudo o que ela jamais pudera ser... Negou-se e pôs-se a pensar inquietudes. Eles quase discutiram enquanto ele tentava provar a ela objetivamente que o seu ciúme não fazia sentido, que não tinha direito a ele. Ela odiava a mania que ele tinha de organizar a vida em fórmulas matemáticas. Cansada de ouvir seus cálculos, ela dormiu sob um céu azul escuro.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Quarta-feira, 24 de dezembro de 2014, Paris, França.

Ah, Paris, Paris... Desde a janela do trem podia-se ver a mudança no ar, no céu, nas longínquas casinhas francesas do interior que iam preparando os olhos do viajante para o esplendor da cidade que é a queridinha dos sonhos de onze em cada dez pessoas.
Era um típico dia de inverno parisiense, nublado como os sonhos dela, mas impressionante e inexplicavelmente lindo. Há em Paris uma essência envolvente, um torpor que te transforma pelo simples fato de estar ali, de saber-se em Paris. Cada rua estreita com seus cafés caros e suas porções mínimas dialoga com você num francês que não é, sob nenhum ponto, arrogante. Cada ponte é tão linda e triste que dá vontade de morrer em uma delas. E naquele 24 de dezembro, véspera de natal, eles estavam lá, na capital da cultura e do amor, em umas das cidades mais românticas do mundo, para ver muito amor desperdiçado.
Apesar da chuva, eles aproveitaram o dia. Andaram por pontes, subiram a Torre Eiffel, fotografaram-se. Por horas, ela chegou mesmo a esquecer que carregava um coração partido. Porém, na cidade do amor, não dá para manter isso escondido por muito tempo. Ali estavam eles, os casais felizes a esfregar na cara dela o que ela não tinha, cada gota do seu amor sonhado, cada pedaço do seu amor rechaçado. Ele esforçava-se para parecer bacana, para fazê-la sentir-se bem. Ela esforçava-se de volta e iam assim equilibrando as forças e mantendo um equilíbrio. Fazia frio e ele abrigava-se nos próprios braços, ela desejava abrigar-se nele. Não prometera que não a deixaria sentir frio?
Os Campos Elísios são uma avenida de muitas luzes e de lojas caras, e ao fundo pode-se ver o Arco do Triunfo. Quem diria... Para onde foram os campos... Ao fim do dia, em meio à famosa Eliseé, ele ainda mantinha a alegria, a suposta alegria natural por estar em Paris. Ela já estava exausta de tanta alegria dissimulada, de tanta obrigação de estar feliz. Dentro dela, como em Paris, chovia.
¡Estás en Paris y como qué no importa!
Encasacou sua tristeza outra vez e pintou no rosto algum contentamento. Em sua alma, era exatamente isso: não importava. Os franceses tomaram a Bastilha, fizeram revolução, estava tudo ali. E daí? Ele não quisera o seu amor.
Já em casa, em clima de natal, eles ensaiaram algum carinho e dormiram sem pensar em um Before Sunrise.


quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Terça-feira, 23 de dezembro de 2014, Amsterdã, Holanda.

O dia amanheceu quase ao meio-dia. Que frio! Que preguiça! Ela, como sempre, despertara antes. Ele, porém, não tardou em despertar e pedir-lhe o café. Realmente, o homem dos seus sonhos. Quem haveria de dizer...
Na barraca de sanduíches típica e deliciosamente holandesa, ela finalmente sentiu-se, após logos dias que passavam incrivelmente rápido, bonita. Ganhou um elogio. You’re beautiful, I loved your eyes. Graças a Deus seu inglês lhe permitia entender aquilo. Sentiu-se bem, leve e de quebra, ganhou um desconto. A excitante história da paquera amsterdanesa não fez tanto sucesso de volta ao quarto. Qué cosas raras te dicen. Não acreditava na história dela? Não importava, ela estava breve e verdadeiramente feliz por haver recebido o seu elogio europeu, mesmo não querendo desfrutar dele. Era bom sentir-se mulher, a pretty woman.
Na briga contra o frio e a preguiça, o natural sempre quase os vencia, e do dia restavam-lhes apenas algumas doses. Não houve Van Gogh nem Mercado das flores, tropeçaram no meio do caminho com restos mortais, Body Worlds – The Hapiness Project. Irônico tema. Motivo de briga no dia anterior, ali estava ela a render-se ao desejo dele, por mais que tentasse, não resistia à possibilidade de fazê-lo sorrir, e ficava a esconder suas lágrimas por trás daquele sorriso. Foram, na cidade onde a vida acontece de todas as formas, ver gente morta.
O fim de noite brindou-os com cervejas antigas e outras caras. Junto aos novos conhecidos dela e aos velhos conhecidos dele, eles se divertiram. Era sempre melhor quando havia alguém mais. Naquela harmonia, eles eram facilmente confundidos com uma pareja feliz. Do outro nada se sabe.
De volta a casa, tendo o frio como abraço, ela caminhava tristemente e mantinha-se bem atrás a observar o novo lindo casal que acabara de conhecer, como os invejava... Ele não entendia e odiava que ela caminhasse sempre tão lentamente. Ela não tinha vontade de explicar-lhe nada, queria ficar a sós com seus pensamentos.

Em casa, ele a deixou, saiu e voltou em seguida, quando os olhos e os pensamentos dela começaram a entender-se. E no meio de um poema nunca terminado, ele a tomou uma vez mais e ela, tremendo de frio, deixou-se envolver por aquele calor.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Segunda-feira, 22 de dezembro de 2014, Amsterdã, Holanda.
Para ela, Amsterdã era como um grande formigueiro muito bem planejado. Não havia espaço, mas todos chegavam a todos os lugares sem muitos problemas. Havia gente de todos os tipos por onde quer que você nem pudesse imaginar, e os edifícios pareciam brotar de onde não deveriam caber. Tudo muito antigo e lindo, lindo de uma forma estranha. Mas ela estava cansada, cansada de correr para tentar chegar e cansada da sensação de nunca estar.
Ele sentia-se em casa. Conhecia o lugar, inclusive morara ali há cerca de um ano. Não via muita graça naquilo tudo, exceto nas garotas de rostos perfeitos que surgiram de todas as partes e faziam a mulher ao seu lado parecer pouco mais que nada.
Ela tentava excitar-se com a ideia de estar em um lugar onde tudo parecia permitido, mas a indiferença com a qual ele a tratava a entristecia de uma forma que a fazia diminuir a olhos vistos. Se alguém a medisse, provavelmente descobriria que ela perdera alguns centímetros desde que desembarcara em Lisboa. Os desejos dos dois quase nunca convergiam e ele não escondia a sua insatisfação por ter de estar com ela nos lugares que não lhe apeteciam. Se ela ao menos valesse a pena... Fosse uma dessas amsterdanesas que só existem ali e nos filmes e ele poderia ir ao inferno com ela pendurada em seu pescoço. Mas ela... até o braço dela enroscado ao seu o incomodava. Arranjou uma desculpa para não tê-la mais grudada a si, o atrito desgastava-lhe a jaqueta que lhe custara duzentos e cinquenta euros! Ela sentia-se tão mal por tudo que até se sentiu culpada por estragar-lhe a vestimenta. Tivesse dinheiro sobrando e provavelmente lhe haveria comprado uma jaqueta nova. Mas era pobre e havia trabalhado duramente para estar finalmente ali, a desperdiçar amor.
O primeiro dia em Amsterdã havia sido cansativo para o corpo e para a alma dela. Andaram e brigaram muito. Só doses de ilusão para evitar que ela sumisse. Entregaram-se a elas. Ela bebeu até sentir-se viva e pela primeira vez, comprou café com ele. Sentia-se livre, leve, não se importava de não encontrar o caminho de volta. Ele caminhava abraçado a ela e não reclamava. O mundo poderia acabar.

Ela queria transar com toda aquela sensação envolta, mas ele queria apenas dormir só. O transe não foi suficiente para segurar nela uma lágrima triste sob a qual ela adormeceu.

domingo, 15 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Domingo, 21 de dezembro de 2014, Barcelona, Espanha.
O segundo dia em Barcelona amanheceu cedo demais para ele e tarde demais para ela. Mal se fez dia e ela já se aprontara em minissaia e meia-calça. Queria sair, caminhar, ver qualquer coisa que desviasse o seu pensamento das palavras que ouviu durante a madrugada. Odiava tudo o que o homem deitado ali a fazia sentir. Odiava amá-lo e odiava ser tão sensível, tão romântica, tão idiota. Ele seguia inerte, deitado, cheio de sono depois de dormir por toda a noite.
Por fim, depois de ela muito insistir, saíram a ver a Barcelona de Gaudí. Gente por todos os lados. Orientais por todos os lados +1. Espanha ou Japão? A Sagrada Família é sensacional e a impressão começa na fila, qui-lo-mé-tri-ca.  Imagine como seria se custasse menos de vinte euros.
Ela olhava tudo sem grande interesse, sem grandes impressões. Foi distanciando-se dele, que ao contrário dela, deleitava-se com cada detalhe, prestava atenção em tudo, fotografava cada letra, cada cor. Ela ia distanciando-se dele, queria livrar-se daquela dependência. Foi indo, sozinha, até que, perdeu-se dele.  Gente demais, voltaria a encontrá-lo? Ele, não muito longe dali, estava furioso. ¿Cómo que se va a perder? A raiva era bem maior que a preocupação. Parte da sua visita à catedral comprometida por ter de procurá-la. Não podia acreditar em tamanha estupidez. Por fim, encontrou-a. Ela respirou aliviada e com alguma felicidade. Ele concentrou-se em dizer a ela, de forma pouco efêmera, que perder-se, naquela situação, era bastante idiota.
O clima entre eles tornava-se, cada dia, menos amistoso. Ele parecia caminhar cada vez mais rápido, ela parecia cada vez menos disposta a acompanhá-lo. E iam assim, cada um ao seu ritmo, aumentando a distância a cada cidade.
O fim de tarde em Barcelona era lindo. Ela sentou-se a mirar o pôr-do-sol, a pensar poesias, a sonhar com tudo o que poderia ter sido. Ele, ao longe, fazia questão de não percebê-la, de não pensar nela, de não vê-la.

Uma cerveja à beira-mar, duas... As coisas ficam tão mais leves. Ele parece mais doce, ela, mais graciosa. Risos. Por que não podiam rir mais... Ela perguntava-se. Ele perguntava-se. Não se pode estar bêbado o tempo todo.

Ao deitar, a mão atrevida dele tornou a buscá-la. Envolvida pelo álcool, pelo calor dele, pelo desejo do seu próprio corpo, ela deixou-se levar uma vez mais. E novamente não houve carinho. Não houve atenção. Não houve nada. Ela feriu-se. O filme ao lado era mais importante. Mandou-o ao cinema. Dormiu mal e ferida outra vez.  Ele satisfez-se com a tevê e dormiu em paz.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

A arte do desencontro

Sábado, 20 de dezembro de 2014, Barcelona, Espanha.

Saíram de Madri extremamente atrasados e ela, mesmo com os pés destroçados pelo salto alto da única bota que ela insistira em levar, teve de correr. Quando finalmente chegaram a Barcelona, ela se sentia terrível, parecia carregar no rosto, nos ombros, além do cansaço da jornada, toda a dor da rejeição, a frustração do amor não vivido, a desilusão da possibilidade que não foi. O dia passava, desgastava-se a nova esperança surgida na noite anterior, ia aos poucos se desintegrando.
Passeando à noite pelo porto de Barcelona, ao lado dele, não podia parar de pensar em como simplesmente ele podia, sem o menor esforço, não lhe dar atenção. Desejava estar sozinha ali, ser-lhe-ia menos penoso. Os barcos, as luzes, o mar, o vento frio, o homem a quem aprendera a amar e a solidão em seu peito.
O jantar foi espetacular. Mariscos à beira da praia, cerveja, risadas. Por alguns minutos, ela esqueceu que estava sozinha. Na volta para casa, nutriu a última esperança de que ele voltasse a si e a tomasse nos braços. Não aconteceu. No quarto, ele deitou e dormiu tranquilamente, totalmente esquecido da mulher ao lado dele. Ela não pôde dormir, os pensamentos a enlouqueciam. Não podia suportar a ideia de que toda a sua entrega não havia representado nada para ele. Isso a maltratava de uma maneira que ela nem saberia como descrever. Tentou ler, mas não conseguia concentrar-se. Saiu, baixou ao hall. Quem sabe alguém para conversar... Nada. Voltou.
_¿Saliste? ¿Qué te passa?
Ao menos notara sua ausência, era mais que um criado-mudo daquele quarto. Deu-lhe uma desculpa: insônia. Ele tentou abrigá-la em seus braços, com o único intuito de ajudá-la, de fato, a dormir. Ela não podia acreditar. Queria gritar, queria matá-lo. Odiava-o naquele momento. Não se pôde conter. Interpelou-o, acusou-o. A resposta foi simples e dura. Havia sido para ele uma noite apenas, como uma desconhecida qualquer com quem tivesse sexo e nenhum laço, concluía ela. Virou-se e esperou insatisfeita que o dia amanhecesse. Quanto de olheiras acumularia até o fim da viagem?


A arte do desencontro


Sexta-feira, 19 de dezembro de 2014, Madri, Espanha.
Ainda não conseguira dormir bem. Entrava luz no quarto e ela o via ao lado, lindo e completamente adormecido. Com que sonhava? Mais um dia amanhecia na linda Madrid. Era necessário guardar as mágoas no bolso e, na medida do possível, tentar desfrutar do momento. Não era fácil. Numa cidade linda, num frio de dezembro e com tantos casais ao redor, rogava por ser amada. Calava em si o clamor, punha um sorriso no rosto e seguia caminho.
À noite, quando todas as esperanças dela tinham-lhe dado adeus, ele veio tocá-la; ela sentiu-se feliz por um momento, quem sabe ele finalmente voltara a ver nela o que parecia ter visto no primeiro encontro.

Há mais de três anos ninguém a tocava. Guardava-se para o amor. Cansara-se de ser um simples momento de êxtase de alguém, de si mesma. Ela sentia amar aquele homem, cada centímetro do corpo dele. Entregou-se entre medo e desejo. Ele não a amou como ela sonhara, imaginara, e como ele, por longos meses, tantas vezes prometera. Foi cuidadoso, mas não carinhoso o suficiente, era demasiado direto. Ainda assim, quando após certo esforço, ele finalmente entrou nela, ela sentiu o prazer de senti-lo dentro, e sentia que finalmente era dele. O gozo veio e junto com ele a esperança de que, a partir de então, tudo seria diferente. Adormeceu nos braços dele, cansada e feliz.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Quinta-feira, 18 de dezembro de 2014, Madrid, Espanha. - A arte do desencontro

Quinta-feira, 18 de dezembro de 2014, Madri, Espanha. - A arte do desencontro

Levantou-se com o cansaço de dois dias no rosto e no corpo. O estômago seguia embrulhado, não lograva estar fisicamente bem, todo o corpo era um reclamo. Esforçava-se para parecer bem, para dar a ele o melhor de si, sorria-lhe de bom dia.
A viagem de avião foi breve. Apesar do incômodo, ela sentia-se bem apoiada no ombro dele, de mãos dadas. Era chegado o amor?
Finalmente o descanso de um hotel. Ele a tomaria nos braços finalmente? Na cama em frente, mais uma vez, ele dormia. Ela banhava-se, perfumava-se, tentava de todos os modos chamar-lhe a atenção. Ele parecia não vê-la.
O amor tão sonhado e sutilmente provado desprendia-se dela, ela sentia, sentia e não queria acreditar. A interrogação martelava-lhe a cabeça, doía-lhe, massacrava-lhe. Lançou a ele então a pergunta sem querer ouvir a resposta, mas a resposta veio, forte, cruel, fulminante. O amor que ela nem chegou a ganhar, perdera-se de repente. Uma dor trespassou-lhe o peito e ela chorou, chorou como uma criança, em desespero, inconsolável. Ele não chorava, mas igualmente não encontrava saída, consolo. Não queria magoar a amiga tão querida, por anos cultivada, mas não podia amá-la, não como mulher, não como ela desejava. Sentia o sofrimento dela levar-lhe a amizade que tão naturalmente havia se consolidado. Era triste, era doído e não tinha remédio. Culpava-se. Por que a beijara? Por que plantara nela a semente da ilusão? Ela sofria, parecia um sofrer sem fim, e seguia desejando-o. Não entendia. Sentia-se frágil, doente, sem dignidade. Por que ainda o queria? Ferida, ela quis feri-lo também, mas arrependia-se. Não queria vê-lo ferido, não podia. Com tantos dias à frente, restou-lhe encarar o caminho e dissimular um contentamento quase impossível. Bem-vinda à Europa.


sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Diário de viagem - A arte do desencontro

17 de dezembro de 2014, quarta-feira, Lisboa, Portugal.
Desde a adolescência sonhava com o velho mundo. A História, os filmes, a fantasia. Enfim, o sonho se faria verdade. Detrás desse sonho, carregava outros, que escondia muy adentro mas não tão encobertos.
Os dias que antecederam a viagem não foram tão difíceis quanto ela imaginara. Parecia não se dar conta, finalmente o grande dia estava chegando, aproximava-se, roçava-lhe a pele, aí estava!
Recém havia completado trinta anos, a primeira idade que pesa para uma mulher e declara-lhe sem rodeios: ya no eres niña! Para uma mulher, um grande passo: go to Europe!
Aterrissou em Lisboa com o estômago embrulhado, o cansaço evidente e os anseios a picar-lhe as maçãs do rosto. A fila de controle de passaportes era torturante. Estaria ele a esperá-la? Estaria há tempo? Cansava-se? Estava ansioso? Questions, questions, questions... ok! Procura em meio à multidão o rosto amigo que nunca viu de verdade. Ali está, um rosto branco, doce. Sorriu encaminhando-se a ele até ser envolvida pelo seu abraço manso, terno. Tentou beijá-la a primeira vez, ela não entendeu muito bem, esquivou-se sem querer. Investiu novamente e seus lábios tocaram os dela de forma tímida e delicada. Ela sentiu neste minuto o prazer nunca antes sentido do amor recíproco e foi imediatamente envolta em uma aura de segurança, paz e euforia.
O caminho ao hotel era longo e em meio ao percurso nenhum dos dois encontrava bem as palavras a serem ditas. Sentada em frente a ele, ela mirava-lhe os olhos sem muita discrição. Fascinavam-na desde o primeiro momento. Tinham uma cor de mel quando posto contra a luz. Eram lindos.
Finalmente a sós. Em algum quarto de hotel em Lisboa, duas almas tão conhecidas lutavam por reconhecer no outro cada parte de um querer tão cultivado. Ela ansiava por um beijo mais, um toque mais, a respiração dele pertinho. Ele então a tomou nos braços, fê-la deitar-se junto a si e começou a preencher com beijos e mãos o calor que exalava dela. Toc, toc! A boca desprendeu-se do seio e atendeu à porta, que inconveniente! So fast! Ela conteve o desejo e concordou gentil e desconcertada. Ele adormeceu ao seu lado, ela não pôde dormir.


Caminhando pela cidade, não havia mãos dadas, não havia intimidade suficiente, e as mãos dela se punham geladas, petrificadas, doentes. A boca esperava mais um beijo que nunca vinha, um ensaio, nada mais. E no frio inverno europeu, ele dormiu ao lado do corpo dela seminu.

Hay un abismo donde antes había lo que faltaba

Hay un abismo donde antes había lo que faltaba
Me hace falta la mirada de antes,
Las palabras de antes,
Las promesas y las ilusiones de antes.
Caminamos por las calles
Qué lindo el alrededor
Qué triste se pone mi alma
La vida se me escapa
Las horas vuelan
Sigo ahí, atrapada.
Busco en todos lados la mirada que me hacía
creer en todo
La misma mirada me pone céptica
Las palabras de ahora me parten el corazón,
Me cortan el alma,
Me quitan las fuerzas,
Me ponen hacia abajo.
¿Qué me hizo cambiar?
¿Qué te hizo cambiar?
No encuentro las respuestas,
no entiendo las preguntas
y me confundo una y otra vez.
París, 27 de diciembre de 2014.

 

Extraño tanto tu sonrisa, mi amor

Extraño tanto tu sonrisa, mi amor
Tu voz, tu mirar
Ah esa mirada que me fascina…
Soy otra cuando me miras
Soy linda, soy fuerte
Sin tu mirada soy tan débil
Sin tu sonrisa soy tan frágil.
Quisiera tener una memoria gigante
No olvidaría nunca
Cada risa, cada mirada.
Aún así, te extrañaría.
Quisiera guardar todas las risas y miradas
Sentirlas desde cerca
Tu risa en mi oído
Tu voz, tu aliento…
Una canción desde cerca me hace acordarte
Hay un trocito de ti en Amelie
Te veo ahí, te siento acá.
¿Por qué tardas tanto en llegar?
Puedo ver tu rostro
Qué lindo rostro tenés…
Vasito de leche, nene, mi amor
Vení desde lejos, reposa en mis sueños

Endulza mi noche y despiértate aquí.

07 de septiembre de 2014
“Darling, Se você soubesse como a minha vida ficou monótona; Tão sem gosto de nada. Às vezes tenho impressão que não vou poder mais agüentar nem mais cinco minutos sem te ver.
E ainda faltam tantos cinco minutos, meu bem.”  
Vinicius de Moraes

Y tu boca me tocó...  yo creí haber llegado al cielo. La sensación de seguridad me agarró el cuerpo y no sentía miedo. Me puse a saltar adentro. Pero de una, tu boca ya no me tocaba y mi cielo se destapó. Buscaba en todas partes la sensación del primer momento. No la encontraba. Desesperados, mi cuerpo y mi mente buscaron las respuestas, y las encontraron fuertes, duras, intragables. Mi mente no lo podía creer, mi cuerpo no lo podía soportar y las lágrimas se me cayeron sin piedad. Un dolor implacable traspasaba mi cuerpo y yo me debatía desesperadamente buscando despertarme de la pesadilla. La realidad siguió ahí, a mi lado, lindo, acostado y sin querer tocarme. ¿Qué hacer de un dolor sin remedio? Echarle maquillaje. Pero la lluvia venía una y otra vez y me lo quitaba. Las lágrimas volvían a caer, testarudas, incansables.
El frío, las ciudades más lindas del mundo, el amigo a quien todo lo confesaba, a quien ahora deseo y … nada. En el alrededor, todos se enamoran, a mí me mata la ilusión, el cariño y el amor reprimidos. Unos brazos que me abrigaran, unos besos que me despegaran, un calor que me diera vida. Deseo, y el deseo vuela a mi lado, atormentándome.
Hay noches en que las manos me tocan, en que los brazos me atrapan, en que el deseo me penetra. Pero la mirada desde la pantalla se perdió, las palabras dulces se perdieron, el cariño ya no lo puedo sentir. Pasado el goce del momento, no encuentro brazos que me abriguen y el frío vuelve a cortarme, aún peor. ¿Cómo entender un alma que se importa por lo sencillo? ¿Cómo entender un cuerpo que desea lo intangible? Me lanzo al frío cortante, sola, olvidada. Me quedo ahí, perdida en los pensamientos que ya no me pueden dejar. Qué hacer del cariño, de la angustia, de la emoción, del deseo… esperar que se vayan, que se acaben, que se cansen. Mientras tanto, a mi lado, descansa el amigo amantísimo que ya no es, no puede ser. De tantos cinco minutos que esperamos, ya no resta ninguno.


París, 27 de diciembre de 2014. 

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Todas mis palabras


 Recuerdo como ahora el momento en que te vi por primera vez. Qué linda tu cara la primera vez que te miré, que me miraste, que nos miramos. Era una mezcla de ternura, ansiedad y confort. En fin, estamos. El abrazo tan esperado tenía el calor que el invierno europeo me intentaba quitar y el beso que siquiera imaginé hacerse verdad, se hizo. El beso me abrigó, me confortó, me pasó seguridad. Me sentí en casa. Pero la sensación no duró tanto. De repente, el suelo se me fue, no sabía qué pensar, qué hacer, cómo reaccionar. El beso no se repetía y el abrazo se alejaba a cada tanto. Ya no sentía tu mirada hacia mí, antes se huía. Intenté de todos modos hacer que nada de eso me hiciera daño, me tocara, me cambiara. No pude. La mirada perdida en algún lado o usada con pesar, inquietud, me hizo querer gritar, huir… Segura de las respuestas y abrigada en mi dolor, aún así pregunté, y la respuesta me dañó el alma. Buscaba en todos lados la seguridad que había sentido hace poco y sólo encontraba el desaliento.
Verte sufrir por hacerme sufrir me destrozó, debería encontrar una forma de arreglarlo o de al menos, hacerte creer que todo estaría bien. No podría hacerte infeliz por mi infelicidad. Busqué fuerzas dónde no sabía que existían, me sequé las lágrimas y me puse de pie. De todo, siempre restaba algo bueno y eso debería sacarme hacia adelante. Pero qué difícil mirar el alrededor, todo el ambiente romántico, el hombre a quien tanto quería a mi lado y tener solo la soledad como abrazo.
La primera vez que me quisiste tocar fue una mezcla de deseo, esperanza y desaliento. Quería tanto que me hicieras el amor… Durante más de tres años esperé la oportunidad de estar con alguien a quien yo quisiera de verdad y que me quisiera igual. No pude sentir este querer… El hombre adentro mío me penetraba nomás. No sentía en tu toque, en tu mirada, en tu beso, el querer que sentí tantas veces desde lejos. Aún así, nacía en mí la esperanza que desde entonces pudiéramos volver al comienzo. Pero no pasó. Al día siguiente, el beso de buen día no vino. El abrazo de cariño estaba más alejado. La mirada era más amarga a cada tanto. Otra vez lloré, otra vez se me fueron las fuerzas, otra vez quedaba inerte. No pude dormir, los pensamientos iban y venían en olas que me quitaban el sueño y me destrozaban el alma. Hice reclamos con la intención de que, en algún lado, el amigo de antes se despertara y me dijera simplemente “lo siento”. No logré despertarlo. El hombre que me contestaba al lado yo no lo podía reconocer.
Bajo la lluvia, bajo un cielo gris, en la ciudad del amor y de los sueños, cuántas veces al mirar el entorno deseé sentir al menos una mirada dulce. Nunca me llegó. Pero por la noche, una mano y una boca a veces me tocaban el cuerpo y lo despertaban. Mi cuerpo, cansado y sediento de algo de cariño, no resistía, se entregaba en búsqueda de un beso de amor que nunca llegaba. Me preguntaba: ¿Tendrá vergüenza de estar conmigo por la calle? ¿Seré tan poco atrayente que no quiere ser visto a mi lado? ¿Demasiado vieja? ¿ Hedionda? No encontraba las respuestas, pero me sentía cada vez más débil y el autoestima completamente derrumbado. No era capaz de sentirme mujer.
De poco a poco me fui acostumbrando a la idea de que no viviría mi romance tan soñado. No serías mi Jesse, yo sería tu Celine. Era disfrutar lo bueno, olvidar lo malo. No siempre me era posible. El corazón desavisado, inconformado, a veces me hacía reclamos y yo me quedaba a mirar tu rostro al lado a dormir y me decía a mí: esa carita jamás volverá a mirarme con el querer y el calor con que lo hizo cuando todo esto todavía no era. ¿Qué importaba La Bastilla, Versalles, La Torre Eiffel iluminada, las góndolas de Venecia? Las noches estaban lindas y tú no estabas conmigo. Prometí a mí que no serías el eje de mi viaje. No lo logré. Quizás si hubiera más gente, cosas que me cambiaran la atención. Solita a tu lado, en algunos de los lugares más lindos del mundo, no lo pude, soy demasiado emoción para lograrlo. Lo siento…
Los días se fueron avanzando y con ello sentía volverme cada vez más pesada para ti. Ya no sentía nada de ternura en tu voz, en tus gestos… No importaba que hiciera, nunca estaba bien. Las respuestas nunca eran las correctas, por fin, ya no hablaba. Observaba, escuchaba, me perdía en mis pensamientos y guardaba cada herida en un lugar secreto donde solo yo las accediera.
Cuando la esperanza ya se me había ido y yo caminaba como si nada, volví a tener mi trozo de cariño. Jamás olvidaré el beso verdadero que me tocó en nuestra última noche en Florencia. Fue tan lindo e inesperado que nunca hablé de ello. Quizás para no gastarlo, no sé. Afuera del bar, el frío me cortaba. Me sentía sola, perdida en mis pensamientos, en mis dolores y de repente, un beso tierno me tocó los labios sin que lo rogara. Fue tan lindo que las lágrimas se me vinieron al borde de los ojos. Inolvidable. Otros besos se siguieron, calientes, fuertes y me entregué a ti como nunca antes. Pero una noche no dura para siempre…
Año nuevo en Roma, ¿quién no lo soñó? Un beso tímido una vez más me tocó los labios a la media noche y quizás seguiría bien toda la noche. Pero la belleza cruzó con nosotros en la calle y ya no me veías. De insegura que estaba me fui al suelo. Me sentía la mujer más fea del mundo y hacía reclamos a los dioses “¿por qué no me hicieron más linda para que me pudiera querer?” No contestaron… Cuando en la cama me tocó la mano deseosa, sentí que estaba envuelta en hielo. Me picaba, me dolía y no pude seguir. ¿De respuesta a mi dolor? Un insulto y un choque de realidad. De tan cansada, dormí.
No hubo más cariño, no hubo ternura, no hubo una huella más de lo que un día fue mi amigo, a quien siempre admiré ni del abrazo que probé a la primera vez que te vi. Del beso en Florencia nada restó tampoco. Tengo el corazón lleno de espinos y me cuesta respirar.

Escrito en vuelo Roma- Lisboa 03/01/2015

Aline Alves