Sábado, 27 de dezembro de 2014, Veneza, Itália.
A viagem para a Itália não teve nada de sonho europeu, foi antes de tudo
um pesadelo. Saíram de Paris atrasadíssimos e ela ainda pensou haver esquecido
a câmera no hotel. Não havia. Andava tão aérea em meio àquela aura de desejos
reprimidos e sonhos esmagados que esquecera que havia posto a câmera no bolso
da jaqueta. Ela se odiou, ele a odiou. Ela se sentia tão mal que mesmo sendo
muito cética, pedia em pensamento o tempo todo: por favor, que cheguemos a
tempo.
Por fim, chegaram a tempo, a tempo demais. O voo atrasou cinco horas,
cinco horas em que eles tiveram de ficar ali a odiar-se mutuamente. Durante anos,
eles tiveram o que dizer por horas seguidas, quase que diariamente, e eles nem
se conheciam... Agora eles estavam frente a frente há apenas dez dias e lhes
escapava pouco mais que um olhar de reprovação e tristeza. Ela então trocou o
olhar vazio por papel e caneta e transformou em poema toda a sua desilusão. Em meio
a tanta espera, ela não encontrou o ombro da noite anterior. Era já outro dia.
Chegaram a Veneza à noite, uma noite gelada, com pouca luz e de comunicação
reduzida. Ninguém falava a língua deles. Foram indo meio levados pelo vento e
quase não encontraram o hotel. A cidade era um labirinto congelante em ruínas. Ela
não encontrava melhor palavra para descrevê-la que ASSUSTADORA. Era inverno na romântica Veneza e o único
pensamento que ela conseguia ter era: os dedos dos meus pés estão congelando! Por
fim, ele encontrou o caminho. Era muito bom nisso, talvez decodificasse o
caminho em números.
No hotel de calefação inibida, eles dormiram abraçados, mas quando os lençóis
se aqueceram, ela fugiu dele e dormiu apenas sob o calor do próprio cobertor.
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