quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A arte do encontro XVII


Desde então foram muitos encontros, para um chá, um cinema, uma apresentação de algum artista em alguma praça, não importava, qualquer motivo servia para estarem juntos.
As férias de inverno iam-se acabando. Como o tempo passava rápido ao lado dela. Que delícia ficar ali sentado em algum lugar, a cabeça dela repousada em seu colo, ele a mexer-lhe os cabelos, observar seus traços, fitar-lhe outra e outra vez os olhos como para não esquecê-los jamais. Estavam namorando? Era oficial? Ainda não tinham falado sobre isso, colocado os pingos nos is. Mas os amigos, que nunca foram tantos assim, reclamavam por sua ausência e por ele agora ter sua atenção toda voltada para ela.  Ele dava-lhes desculpas, ia adiando o desencontro com ela.
Em casa, já haviam percebido que o comportamento dele mudara muito e que vez ou outra uma linda garota vinha procura-lo à porta e que aquela mesma voz às vezes perguntava por ele ao telefone.  A mãe, sempre curiosa, já havia tentado, em vão, descobrir quem era a tal garota. Ele desconversava, respondia superficialmente: una amiga. E fingia uma pressa inexistente para ausentar-se. Não gostava daquela intromissão, escapava como podia para não ter de dizer a mãe simplesmente: !No te metas! Son mis cosas. Embora um dia fosse lhe dizer...

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Das cartas que eu não mando

Te extraño mucho hoy, como hace mucho no me pasaba. Extraño escuchar tu voz y ver tus palabras tantas veces mal escritas.Extraño tu no saber conjugar el pasado y extraño tus confusiones en el presente. Ya no me acuerdo de tu olor, aunque lo adoro. Aquel olor que sale de tu cuello cuando te abrazo. No me acuerdo de la última vez que te abracé, que te senti, que me quisiste. Traigo vivas en la memoria tu risa, tu cara, tu voz. Pero tu último abrazo se perdió en algún lado. Y me hace tanta falta ese abrazo. Tu ultimo beso lo traigo guardado, en la Calle Uruguay, con mi rostro entre tus manos, me besaste; un beso dulce que me queria decir: quédate! Pero me fui... Para siempre? Lágrimas de añoranza se me quieren venir, resvalar por mi cara. Las asusto: !Volvé! que ya no es tiempo...
Ay, el olor de tu cuello... ¿Cómo era el perfume que salía de ti?
23/09/2012

sábado, 10 de novembro de 2012

Das cartas que eu não mando


Nunca estivemos na praia, mas a praia sempre me lembra você. Não sei se o barulho tranquilizador e inquietante das ondas ou o cheiro embriagador do mar; a questão é que sempre lembro. É como se pudesse te ver dançar, seu corpo se movendo... Imagino e não formo as metáforas. As ideias dão lugar a tua imagem e a tua voz. Ah tua voz... Será para sempre uma lembrança doce?
“Y un otoño vacío en el centro que solo se llena...”
Ai, ai, saudade. Tão sem tradução, tão cheia de significado. Estarás sob o frio, olhando a chuva enquanto o sol me ofusca a visão?
Teu calor se distancia de mim como o sol de tuas terras nos invernos chuvosos. És meu inverno em meio ao sol abrasador que me queima retina.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A arte do encontro XVI


          Demorou uns cinco segundos para sair da inércia e devolver o cumprimento de forma quase engasgada: ! Hola! Nem podia acreditar que ela o notara de pronto e não tardara em falar-lhe. Depois do primeiro susto de um início de conversa que havia pensado ele ser tão difícil, continuaram a charla sem nenhum entrave. Ele resolveu perguntar-lhe uma vez mais sobre o livro, fingindo algum interesse, mas ela já notara que ele não era dado a romances literários, e enveredou por outros caminhos. Perguntou-lhe sobre a prova do dia anterior e ele mentiu  ter se saído razoavelmente bem. Ela fingiu acreditar e ficou ali, a fitar nele os traços delicados e fortes. Ainda não havia notado, como ele era bonito... De repente deu-se conta de que se aproximava do seu destino, precisava descer. Perguntou a ele aonde ia e ele respondeu que a qualquer lugar, estava à toa naquela manhã de inverno. Ela então convidou-o para assistir à sua aula e ele respondeu que sim tentando não demonstrar tanto interesse.
A aula o entediava um poco. No começo, fixou-se na voz dela, que era realmente linda. Aquela boca e aqueles olhos nem precisavam falar, no entanto, cantavam, e como era lindo vê-la cantar. Mas, depois de alguns minutos, a monotonia daquela melodia começava a deixá-lo sonolento. Como dormira pouco por esses dias! Aguentou a duras penas até o final. Finalmente!
Ela quis saber se ele havia gostado, ele que nunca aprendera a mentir muito bem, preferiu um "re lindo cantás!" . Ela entendeu, pela expressão pouco entusiasmada dele, o que se passava  e não fez mais perguntas. Caminharam até a saída e ele aproveitou para convidá-la para um lanche. Procuraram um supermercado, compraram algumas guloseimas e foram descansar em um dos parques de Palermo. O sol brilhava imponente, e apesar do frio, o dia estava lindo, o céu estava azul e havia flores brincando em seus lábios. De repente, a conversa cessou, a comida acabou e eles ficaram ali, a olhar-se. Como os olhos dela brilhavam, como a boca dele a chamava... E olhos foram se aproximando mais e mais até que os lábios se tocaram. Nossa! Que beijo! Ele se sentia flutuando. Aos quinze anos, não era seu primeiro beijo, contudo, nunca havia provado nada igual. Despertou do beijo como saído de um caleidoscópio. Deparou-se com aquele olhar, sorriu para ela e pôde, enfim, acreditar que existia. Quis parodiar em pensamento o filósofo com "beijo logo existo", preferiu porém perder-se em outros pensamentos enquanto abraçado a ela sentia o calor do sol a misturar-se ao sangue de suas veias.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A arte do encontro XV


No dia seguinte, teve de arranjar uma desculpa para sair no horário de encontrá-la, assim, casualmente... Afinal, por enquanto, não havia mais aulas. Por pelo menos duas semanas, não precisaria acordar cedo. E era tão bom dormir até tarde naquele friozinho... Mas era preciso vê-la, era NE-CES-SÁ-RIO! Não podia perdê-la de vista uma vez mais.
Plenas férias de inverno e ele estava de pé antes da mãe. Ela nem pode acreditar quando levantou e o viu à mesa tomando café e já arrumado para sair. Perguntou-lhe entre espantada e incrédula sobre o porquê de tal atitude, e ele respondeu simplesmente que precisava, coisas de um amigo da escola. Àquela hora da manhã e ainda sonolenta, ela deu-se por satisfeita e esqueceu as indagações.
Antes de sair, ele olhou-se no espelho. Depois de tantas noites mal dormidas, seguia com as olheiras, porém não havia o que fazer, era esperar as próximas noites e descansar. Saiu pelas ruas como se nem sentisse aquele frio julhino de cortar os ossos. Sentia-se aquecido por dentro, com o coração aos saltos. A ansiedade vinha-lhe a boca num roer de unhas incontrolável. A estação! Bom, dois minutos para a chegada do metrô.
Entrou no vagão de sempre, o terceiro. Três, número primo, seria sorte ou azar? Procurou-a. O moço com o violão a caminhar de um lado para outro lhe atrapalhava a visão. Isso lá é hora de fazer música? Uma vez mais percorreu os olhos pelo vagão, e, perto de uma das portas, um livro resplandecia de delicadas mãos. Passou o olhar pelos braços, o colo e foi dar com aqueles olhos que perdiam-se distraídos da leitura, como se procurassem algo que pudesse ajudá-los a escrever sua própria história.
Ele notou sua distração, acercou-se, mas não pode sentar-se ao lado dela, pois o assento estava ocupado e teve de contentar-se em poder ficar de pé ao seu lado. Antes de conseguir cumprimentá-la, ela o notou: ! Hola! ¿Cómo andás?

sábado, 11 de agosto de 2012

A arte do encontro XIV


Ele- continuação

Aproximavam-se as férias de inverno. Nem podia acreditar, mas passava ileso pelas provas. Nenhuma nota baixa até então, tampouco nada surpreendente, limitava-se a algo acima da média e o fazia a duras penas. Estudava até muito tarde e, consequentemente, dormia pouco. Custava-lhe despertar pela manhã. Ao escovar os dentes, não podia deixar de reparar nas olheiras que lhe estava causando aquela quase uma semana de tormento. Sentia-se pavoroso. Sabia que era culpado por não ter se programado com antecedência para estudar. Agora já não importava, dois dias mais e se acabava o tormento. Chá, biscoitos, mais uma olhadinha no espelho, escola.
Última prova. Estudar! Língua e Literatura, todos aqueles verbos, todo o desenrolar dos enredos, tantos nomes... Estava exausto, mas ainda faltava tanto... Entre um cochilo e outro, acabou dormindo sobre os livros. Acordou pela voz da mãe “Ale, Ale! Despertate!” olhou o relógio ao lado da cabeceira da cama e levantou-se de um sobressalto. Dormira muito mais do que deveria, estava atrasadíssimo. Por Deus! Haveria de ter problemas logo no último dia de prova? Apressou-se, pulou etapas. Esquece o banho! Lavar o rosto, escovar os dentes, pentear os cabelos, vestir o uniforme e voar para a escola. Se não houvesse atraso no metrô, chegaria em tempo hábil.
_ ¿No vas a desayunar, chico? Cuidate, si no enfermás.
_ No puedo, mamá. Como en la escuela.
Chegou bem a tempo de pegar o próximo metrô. Sorte. Entrou, sentou, olhou o relógio e respirou aliviado. Olhou para o lado e... Não podia acreditar! Era ela! Em sua mente, já não era capaz de reconstruir-lhe o rosto com perfeição. Mas agora, ali, ao lado dela, tinha certeza, era ela. O mesmo cabelo a cair-lhe delicadamente pela face, como uma caricia; os mesmos olhos novamente entretidos na leitura, os mesmos lábios entreabertos, abandonados, distraídos.
Precisava falar com ela, urgentemente, pois logo teria de descer e mais uma vez a perderia de vista. Arriscou um “Hola, ¿qué frio, eh?” Que frio? Poderia ter sido mais idiota? Falasse do calor em plena típica manhã de inverno e teria sido mais interessante. Mas ,por sorte, ela era gentil e respondeu-lhe ao cumprimento. “Sí, horrible”.
_¿ Te gusta la literatura?
_ Sí, me encanta. Las artes en general, pero la literatura y la música más.
_ Ah, mira vos. Coincidentemente tengo un examen de literatura hoy, pero a mí no me gusta mucho y, para colmo, estoy retrasado.
_Un bajón. Yo también me estoy yendo a la escuela, pero de canto.
_Ah, !qué lindo!
No fim ela disse que pegava o metrô naquele mesmo horário todas as quartas e sextas-feiras para ir a sua aula, e ele viu aí uma oportunidade de reencontrá-la. Chegou a sua estação. Despediu-se entre nervoso, atrapalhado e feliz, e foi discutir literaturas numa briga que já não importava. Começava a ler a prova e distraía-se com a lembrança do som da voz dela, com a imagem do seu sorriso a dizer-lhe “chau”. Respondeu mal a prova e depois daquela noite mal dormida, sorriu com a certeza de uma nota ruim e caminhou até a estação como se já fosse primavera.
08/08/2012


domingo, 22 de julho de 2012

A arte do encontro XIII

Ele - continuação

Alguns dias se passaram e a lembrança da garota não se havia desvanecido. Pensava nela durante o banho, momentos antes de dormir, na hora de estudar. Sua concentração não era das melhores e a recordação daquele rosto martelando em sua mente em nada o ajudava.
A mãe já notara algo diferente em seu comportamento. Tentava conversar, entender o que se passava. Ele não lhe dava espaço, esquivava-se. Há algum tempo deixara de gostar de compartilhar certas coisas com a mãe, eram somente suas e só a ele interessava, afinal, já não era criança.
Ele temia esquecer-se das feições da menina. Conforme os dias se passavam, ia se tornando cada vez mais difícil reconstruir cada detalhe daquele rosto. Atordoava-lhe a ideia da perda de uma lembrança que era a única coisa que pudera guardar dela. Mas não era fácil manter nítida aquela recordação, sua memória não era tão boa e não a havia visto por muito tempo, para piorar, fora uma única vez.
Depois de mais alguns dias, começou a considerar a ideia de que esquecê-la seria, na verdade, o melhor a fazer. Ela era linda e o impressionara, mas de que lhe servia? Custava-lhe energia mantê-la acesa em sua mente e roubava-lhe ânimo das tarefas diárias, dos estudos. Precisava focar-se nas coisas que realmente faziam parte de sua vida e lançar ao esquecimento essa lembrança insana a desviar-lhe as metas. Para que desperdiçar tanta energia com alguém completamente indiferente à sua existência e que talvez nunca tornasse a ver? Esquecer, esquecer, esquecer!
Esqueceu? Os dias foram chegando a passos lentos, trazendo uma brisa mais fria, anunciando o outono com seus tons pastéis. Ele fixava-se em coisas mais importantes, observava a realidade em redor e fazia reflexões sobre si e o seu entorno. Cobrava-se. Precisava estudar. O período de provas se aproximava e sua distração, por quase um mês, o havia prejudicado. Mas o pensamento logo lhe fugia e aproveitava o tempo ameno e a brisa doce para passear pela cidade, sentar-se em algum parque, deitar-se na grama, perder-se em pensamentos que nada tinham a ver com gramática ou aritmética. Viajava por longos momentos em sua mente, esquecia-se a contemplar partes do próprio corpo. As mãos... como cresciam e pareciam nem ser dele. Às vezes, tocava-se no rosto na intenção de sentir ser ele mesmo a tocar-se. Aborrecia-se ao sentir, raramente, alguma mínima imperfeição, uma pequena espinha, um cravo. Embora tivesse sorte, pois nem mesmo o auge da adolescência tinha-lhe estragado a pele, mudava de humor se notava algo e lhe saltava dos lábios um palavrão, pequena mostra de sua relação com a vaidade. Porém, logo se distraía com grupos de garotas que passavam em suas minissaias ou em seus jeans desconcertantes.
Os hormônios eram outro ponto a driblar na sua luta para manter-se concentrado. No auge dos seus quinze anos, eles lhe gritavam ao ouvido, e, às vezes, entre tantas saias e jeans apertados, era necessário voltar para casa e calá-los com um banho frio. E em meio à água a escorrer-lhe pelo corpo, vez em quando lhe vinha a lembrança doce que, às vezes, teimava em tornar-se sensual, de um cabelo a resvalar por uma face branca e de uns lábios entreabertos a esperar por um beijo.
19/07/2012

quarta-feira, 18 de julho de 2012

A arte do encontro XII - Ele


No final do ano, ganhou uma bicicleta. Passou a ver o mundo de uma forma mais acelerada e por algum tempo, passou a não ter tanta atenção com o meio, como se observasse o mundo a pedaladas, encerrado na euforia do corpo a mover-se, na perspectiva de uma nova esquina, de um cruzamento perigoso, de um beco no meio do quarteirão. Até sentir falta de passos lentos e olhares atentos.
Tinha agora quinze anos, o rosto de menino estava mudando,ia tomando formas viris. Os pelos começavam a incomodar, já não se reconhecia no espelho. Quem era o tal ali do outro lado? Era bonito, feio? Encarava-se, fixava-se na intenção de encontrar-se em algum momento. Era jovem, disso ele sabia. Muito jovem. Uma vida nas mãos, um caminho sem pegadas, sem rastros. Páginas, muitas páginas... Escova, creme dental. Mais uma olhadinha. É, parece ser mesmo ele. Hora de ir.
No caminho até a estação de metrô, tentava organizar os pensamentos. Iniciava o ensino médio, iniciavam-se muitas dúvidas. Profissão, cabelo curto, cabelo longo, barba e o que haverá de almoço.
Era por meados de março, e o dia estava lindo. O super calor do verão havia partido. O sol brilhava imponente, mas soprava uma brisa doce só interrompida pela entrada na estação. Sob todo o concreto o lugar fervilhava. Comprou bilhete para duas viagens e foi acomodar-se no terceiro vagão. Olhava de forma desatenta ao redor, o olhar automatizado de quem se acostuma à repetição. Todos os dias acordar cedo, preparar-se para ir à escola, cumprir as tarefas diárias. Tudo sempre igual. As mesmas ruas percorridas, as mesmas caras no metrô, as mesmas... han? Uma cara nova, uma linda cara nova com longos cabelos negros que lhe caíam sobre as espáduas e delicadamente sobre o rosto, numa franja que quase lhe cobria os olhos. Tinha aparentemente a mesma idade dele, com o mesmo ar de quem se sabe jovem. Lia despreocupadamente um livro, indiferente ao olhar do nosso herói ali adiante. Ele tentava olhá-la de maneira disfarçada, mas perdia-se como hipnotizado em alguns momentos. E, tão logo, hora de descer. Ela se fora. Para sempre? Andou por todo o quarteirão lembrando-se de cada detalhe do rosto dela: os olhos amendoados, a boca bem feita e entreaberta num gesto distraído, a pele branca. Linda, linda.
Esteve toda a manhã sem conseguir concentrar-se na aula. Enquanto a professora flexionava verbos e ditava regras, ele desenhava traços que imitavam um rosto feminino e escrevia palavras soltas que só ele entendia.
Foi para casa sem pensar no almoço e comeu como se já tivesse comido.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

A vos


Me encantan tus palabras
Olas de pensamientos viajan hasta mí
Me sorprendes
Una caja de Pandora
Un regalo de cumpleaños
Una linda canción al fin del dia
Encuentro del sol y del mar
Que quema el frio
Una voz a lo lejos
Fuerte
Háblame al oído
Suena dulce
Viajo en tu sonrisa...
¿Qué perfume tendrá?
¿ Qué secretos me iba a entregar?
Allá, más allá de la frontera
Entre un sol medio azul y blanco
Estás

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Olvidos poéticos

Ya no viene
Queda lejos la sensación
La emoción
La visión
Dónde estás, mi querida?
Mi amada...
No vienes a mí
No me despiertas
Te alejaste
Me olvidaste
Juegas al escondite
Me desespero a buscarte
Estás? Estás?!
Se me escapa tu ruido
A lo lejos siento
Se me viene el olor
Vuelve amada mía, vuelve...

Reencontros...




Já não vou, vens
Não como a tormenta de outrora
Vens em brisa leve
Quando o calor é tanto que já
                    nem te espera
Embora te queira
Já não estou
Posso estar
E na possibilidade me apanhas
vez em quando
Faz-me cócegas
E me desnudas entre ruas
que parecem desertas
No receio do olhar intruso
me deleitas
E em meio a lençóis invisíveis
Faz-me mulher uma vez mais

quarta-feira, 11 de abril de 2012

A arte do encontro XI

ELE (continuação)
Apaixonou-se pela primeira vez aos dez anos, mas não confessava nem para si aquela paixão. Não entendia muito bem o que era paixão, amor, não entendia. Buscava em seus pensamentos a explicação para aquela sensação de vibração no estômago cada vez que se aproximava o momento de vê-la e para aquele desconforto na cabeça e no coração cada vez que seus olhos a tocavam. Estaria doente? Precisaria de um médico?
Passou a isolar-se, martelando a cabeça com tentativas vãs de entender e acabar com aquele turbilhão de sensações desconfortáveis. Começou a observar tudo ao redor, e pouco a pouco foi juntando pistas para explicar para si de que se tratava sua tal enfermidade. Por fim, acabou por entender tudo em um filme. O personagem apresentava os mesmos sintomas que ao fim pioraram quando ele se envolveu em um beijo profundo que terminou em confissões adocicadas. Estaria ele apaixonado?! Não, não podia. Garoto demais. Tantas outras coisas por fazer. Tantas guerras imaginárias ainda por lutar. Precisava ajudar a resgatar as Malvinas. Estava... agora sabia. Sabia mas não confessaria. Que tipo de garoto se apaixona aos dez anos de idade? Seus amigos ririam de sua cara se soubessem. Que idiota ele era...
Descoberta a doença, tratou de combatê-la, e como não havia fórmula pronta, ele mesmo preparou a receita e iniciou o tratamento. A estratégia era combater os sintomas, se pudesse fazê-los desaparecer, se sentiria curado. Solução: não vê-la mais. Difícil... estudavam na mesma escola, embora em salas diferentes. Precisava fugir dos encontros nos horários comuns: entrada, saída, recreio.
Chegou propositalmente atrasado no primeiro dia após o plano, e para seu pesar, ela também se atrasara. Foi aquele turbilhão de sensações outra vez. Deus, como não olhar para ela? Ela sorria com o rosto inteiro, os olhos brilhavam o cabelo caia-lhe delicadamente sobre a face. Era toda ela um encanto, parecia uma princesa das historias que ouvia no jardim de infância. Perdia-se mirando-a, imaginando-a junto de si em brincadeiras ainda muito inocentes.
Nesse dia não foi para o recreio. Ficou na sala brincando com seus bonecos, inventando uma guerra. Os dias seguintes seguiram-se iguais: ele não saia no recreio, chegava antes de todos à sala e era sempre o último a sair.
A garotinha loira de olhos cor de mel passou a sentir falta de um bonito garoto que sempre a olhava de um jeito que lhe parecia meio engraçado. Não sabia por que, mas gostava quando ele estava por perto. Por onde andaria ele...
Alguns meses se passaram e chegaram as férias de verão. Ele já não pensava tanto nela. Algumas vezes lhe vinha alguma lembrança; não podia esquecer o jeito como ela sorria. Mas sentia-se muito mais tranqüilo agora. Sua enfermidade estava controlada.
No dia de retorno à escola, voltou a sentir-se estranho. As horas que antecederam a sua ida ao colégio foram-lhe insuportáveis. Olhava o relógio digital sobre o criado mudo, roia as unhas, balançava as pernas, numa espera torturante até a hora de partir. Ao fim, resolveu ir na hora certa, sabia que a encontraria logo na entrada e que todos os sintomas voltariam, que se sentiria outra vez perdido. Não importava, precisava reencontrá-la, rever os olhos amendoados, o sorriso doce. . .
Chegou à hora pontual. Olhou ao redor, não a viu. Buscou-a com o olhar por todos os lados, tocou o sinal e ele não a encontrou. Atrasara-se? Faltara? Não sabia.
Não pôde concentrar-se na aula. Pensava nela: haveria chegado? Na hora do intervalo voltou a procurá-la, andou por toda parte, inútil. Ela não estava. Pôs-se a se perguntar que haveria acontecido. Em todo o primeiro semestre de aulas ela não faltara uma só vez, por que faltaria agora? Quedou-se assim com os pensamentos a dar-lhe voltas, atordoá-lo, e assim permaneceu por longos dias. Todos os dias a mesma busca, o mesmo sentimento medonho a corroer-lhe o peito e a mesma sensação angustiante de nada poder fazer. Assim foram se passando os dias, até que tornaram-se menos longos e ele voltou a ver alguma graça nas suas brincadeiras infantis com gigantescas batalhas imaginárias. Só pela manhã vinha-lhe, às vezes, alguma lembrança quando a mãe lhe trazia amêndoas no café, mas logo se ia desvanecendo e ele voltava a ser o menino comum que nunca deveria ter deixado de ser.
A milhares de quilômetros dali, ao sul do país, uma menina doce, de longos cabelos loiros e olhos amendoados sorria para o garoto de cabelos compridos que a olhava na entrada da escola e pensava: por onde andaria o garoto bonito da outra escola, que a olhava de forma tão terna. Que saudade sentia daquele olhar...

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A arte do encontro X

ELE
Fisicamente, sempre se parecera muito com a mãe. A natureza lhe brindou com a beleza que só um mestiço possui. Uma mistura de sangues latinos entre América e Europa que resultou em algo quase hipnotizante para as mulheres. O nariz perfeito, a altura acima da média, o corpo esbelto, os músculos bem trabalhados, a boca grande e a voz forte e grave davam a ele um ar de virilidade e o faziam exalar testosterona. Um imã aos olhos femininos, uma armadilha aos corações fragilizados. E ele sabia, sabia a sensação que causava no sexo oposto e jogava com o seu poder. Satisfazia-o saber que era alvo de olhares, de desejos... Era meio narcisista, embora nunca o houvesse confessado, nem mesmo para si. Perdia-se a mirar-se no espelho ao sair do banho, ao fazer a barba. Nunca deixava pelos no rosto. A pele sempre lisa, bem cuidada e a boca a saltar-lhe no rosto, quase uma ofensa de tão sexy. Mas faltava-lhe algo, sempre faltava-lhe algo...

A arte do encontro IX

Ela (continuação)
Com o tempo vieram novas literaturas, os contos de fada adormeceram em algum lugar e ela já não se podia reconhecer. Mirava-se no espelho buscando respostas às suas perguntas que eram tantas que já nem podia enumerá-las, e, vez ou outra, voltava ao mesmo ponto: e o amor, por onde andará o tal do amor...

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A arte do encontro VIII

ELA (continuação)
E agora, estava namorando? Estava, pelo menos ela achava que estava. Resolveu contar a mãe, que não recebeu muito bem a notícia. Logo, aquilo lhe soou como algo ruim e preferiu continuar em segredo com seu sentimento, nutrindo-o dentro de si.
Todos os dias arrumava-se, perfumava-se na esperança de que ele a beijasse outra vez. E ele a beijou, beijou tantas vezes que realmente começou a ser mágico aquele momento. Até que...
Era uma quinta-feira, dia de prova, e todos saiam mais cedo da escola. Ela saía quando uma colega de classe a chamou. Alguns passos depois, o seu castelo desmoronou. Seu príncipe sem cara de príncipe estava ali, beijando a rainha má. Perdeu-se... O que dizer? O que pedir? O que reivindicar? Não sabia... Não sabia pelo simples motivo de não reconhecer-se em nenhuma categoria. Só sabia que tinha sonhos, mas disso o outro não pode ser responsável.
Saiu, pensou, pensou, chorou, chorou, chorou... esqueceu.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A arte do encontro VII

ELA (continuação)
Um ano a mais. Novo ano letivo, mesma escola, muitas amigas e... novatos. Ele... Alto, moreno, enfim, diferente dos contos de fada. Tão senso comum, e para ela parecia lindo. Como lhe acelerava o coração cada vez que o encontrava, na escada, nos corredores.
Um dia, puseram-se a conversar, ali, em frente à escola e com gente ao redor. Vestida com o uniforme de sainha e com a mochila cor de rosa nas costas. Tão menina, cheia de sonhos nos olhos brilhantes e cheia de tropeços na voz que lhe saía acelerada.
A boca clamava por um beijo, o beijo, o primeiro beijo. Tinha apenas doze anos, mas de acordo com entrevistas preliminares, era a única, dentre as amigas, que nunca havia sido beijada. E de repente, zás! Ela o beijou. Lançou-se ao pescoço do rapaz num relance e teve seu desastroso primeiro beijo. Totalmente diferente do tão sonhado primeiro beijo da imaginação dela. Trazia na boca uma bala e não sabia o que fazer com ela naquele momento, a inexperiência a fez engolir o doce e engasgar-se, una tragédia não maior por não haver-se sufocado. Mas agora todos sabiam: era seu primeiro beijo.
Voltou para casa com sentimentos desencontrados: vergonha, orgulho, desejo, não sabia. Ela tinha beijado, beijado... Foi mais pesadelo que sonho, mas ainda assim, ela pensava sentir-se feliz.

Saudade

Ai que saudade é bicho besta
Não tem orgulho
E vez em quando, lá vem
Pedindo arrêgo
Chega como quem nada quer
Vai por ali, no ombrinho
Desce pro peito
Entra na corrente sanguínea
Instala-se bem na nossa mente
Revira as memórias
já tão quietinhas
Faz uma bagunça danada.
Ai que saudade mexe a gente
Desonera, e a gente vai ficando
Assim
molinho
03/01/2012

A arte do encontro VI

Ela (continuação)
No ano seguinte, mudou de escola, e ...ah! Outro amor! Nossa, o pior aluno!
Toda sexta-feira ela se produzia, ficava linda pra ele e ele nem a notava. Tinha ela agora onze anos e os primeiros sinais de mulher surgiam nela timidamente. Os seios despontavam e aos poucos o quadril ia ganhando contornos. Mas outras eram já tão moças, ela ainda tão menina. Ele simplesmente não a via. E continuou não se dando conta dela até que a reencontrou alguns anos depois. Que diferente ela estava. Sempre tivera aquele sorriso? Não podia dizer, mas sabia que aquele corpo de mulher ela não tinha.
Nessa ocasião ele não pareceu a ela tão atrativo. O frescor adolescente já não brincava no rosto dele, e, apesar de haver emagrecido, isso não o tornara mais bonito, ao contrário, produzia nele um ar menos saudável e o deixava aparentemente mais velho. Além disso, tornara-se um fracassado. Largara os estudos e estava num bar de quinta a embriagar-se.
Ela orgulhou-se de ser quem era e gostou de tê-lo visto. Melhor, gostou que ele a houvesse visto.