segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A arte do encontro XXI


ELA
E ela, o que fazia aos dezessete? Pensava que a vida resumia-se em ser a melhor aluna da classe. Seu universo, de fato, cabia em uma casca de noz. Seu desejo? Entrar em uma universidade, uma pública, que diziam ser melhor. Não sabia que carreira seguir. Sua decisão  confrontava-se entre o que julgava ser uma boa carreira, suas verdadeiras aptidões e sua pouca confiança em si. Sempre fora insegura, desde o jardim de infância. Não sabia lidar com a perda e tendia a escolher o caminho mais fácil, sempre.
Terminou os anos escolares sem um grande amor de adolescência, coisa tão presente na vida das meninas. Desde o primeiro beijo no portão da escola, apaixonara-se muitas vezes: o garoto da outra rua, o professor de matemática, o de inglês, o de informática... Era realmente uma aluna aplicada. Mas a dedicação não lhe deu nenhum diploma. Terminou o colegial solitária. O garoto nunca a pediu em namoro e, por fim, não quis mais vê-la. Ela, porém, continuava a passar pela rua dele, o coração aos saltos, a esperança quase inesgotável. Quando o via, Dios! Ele fingia não vê-la e ela ia-se com o peito a doer-lhe, a cabeça a confundi-la. Demorou anos até dar-se conta: esquece, não é ele. Quanto aos professores, não a levavam tão a sério fora de sala. Era bonita. Uma espécie de Anita a atentar-lhes com sua voz doce e seus movimentos de fêmea desabrochando. Exalava pecado. Vez ou outra, não resistiam, a beijavam, com certa fúria às vezes, chegavam a assustá-la. Mas não ia muito além a coisa. Ela seguia, enchendo-se de fantasias, de desejos que acabavam quase sempre em palavras de um diário, conversas com a amiga mais próxima e lágrimas no travesseiro. Acostumara-se desde cedo a chorar ali, antes de deitar, baixinho, pra ninguém saber.
Dos doze aos dezessete colecionou paixões dolorosas e nenhum amor de novela. E assim chegaria à universidade.
Vestibular... Durante toda a vida pensara, o que iria ser? Quando criança. Imaginou-se primeiramente médica, depois, o amor pelos animais disse: veterinária, mas o pavor total a sangue e a outras coisas pavorosas a fizeram desistir. Chegara ao vestibular sem saber o que fazer. Apaixonara-se aos dezesseis pelo idioma espanhol, que estudava em um curso livre, mas as vagas na universidade eram pouquíssimas e ela nunca confiara muito em si. Os outros sempre confiaram muito mais. Ela perguntava-se, às vezes, seria ela a que acreditavam ser ou a que via no espelho. Nunca soube responder. A confiança de um amigo a fez ir adiante. Seria uma mulher das Letras, Clarice Lispector, Rachel de Queiroz, Florbela Espanca, Isabel Allende. Seria ela, com todos os verbos e conjunções.

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