ELA
E ela, o que fazia aos dezessete? Pensava que a vida resumia-se em ser
a melhor aluna da classe. Seu universo, de fato, cabia em uma casca de noz. Seu
desejo? Entrar em uma universidade, uma pública, que diziam ser melhor. Não
sabia que carreira seguir. Sua decisão
confrontava-se entre o que julgava ser uma boa carreira, suas
verdadeiras aptidões e sua pouca confiança em si. Sempre fora insegura, desde o
jardim de infância. Não sabia lidar com a perda e tendia a escolher o caminho
mais fácil, sempre.
Terminou os anos escolares sem um grande amor de adolescência, coisa
tão presente na vida das meninas. Desde o primeiro beijo no portão da escola,
apaixonara-se muitas vezes: o garoto da outra rua, o professor de matemática, o
de inglês, o de informática... Era realmente uma aluna aplicada. Mas a
dedicação não lhe deu nenhum diploma. Terminou o colegial solitária. O garoto
nunca a pediu em namoro e, por fim, não quis mais vê-la. Ela, porém, continuava
a passar pela rua dele, o coração aos saltos, a esperança quase inesgotável.
Quando o via, Dios! Ele fingia não vê-la e ela ia-se com o peito a doer-lhe, a
cabeça a confundi-la. Demorou anos até dar-se conta: esquece, não é ele. Quanto
aos professores, não a levavam tão a sério fora de sala. Era bonita. Uma espécie
de Anita a atentar-lhes com sua voz doce e seus movimentos de fêmea
desabrochando. Exalava pecado. Vez ou outra, não resistiam, a beijavam, com
certa fúria às vezes, chegavam a assustá-la. Mas não ia muito além a coisa. Ela
seguia, enchendo-se de fantasias, de desejos que acabavam quase sempre em
palavras de um diário, conversas com a amiga mais próxima e lágrimas no
travesseiro. Acostumara-se desde cedo a chorar ali, antes de deitar, baixinho,
pra ninguém saber.
Dos doze aos dezessete colecionou paixões dolorosas e nenhum amor de
novela. E assim chegaria à universidade.
Vestibular... Durante toda a vida pensara, o que iria ser? Quando
criança. Imaginou-se primeiramente médica, depois, o amor pelos animais disse:
veterinária, mas o pavor total a sangue e a outras coisas pavorosas a fizeram
desistir. Chegara ao vestibular sem saber o que fazer. Apaixonara-se aos
dezesseis pelo idioma espanhol, que estudava em um curso livre, mas as vagas na
universidade eram pouquíssimas e ela nunca confiara muito em si. Os outros
sempre confiaram muito mais. Ela perguntava-se, às vezes, seria ela a que
acreditavam ser ou a que via no espelho. Nunca soube responder. A confiança de
um amigo a fez ir adiante. Seria uma mulher das Letras, Clarice Lispector,
Rachel de Queiroz, Florbela Espanca, Isabel Allende. Seria ela, com todos os
verbos e conjunções.
Amei!!!!
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